sexta-feira, 7 de novembro de 2008

LIBERDADE RELIGIOSA


Ontem e hoje

Quando se fala em liberdade, quase sempre se omite a vertente da liberdade religiosa que durante séculos foi associada a uma impossibilidade, porque todas as religiões se auto proclamaram, com maior ou menor ênfase, as detentoras de uma verdade absoluta que deveria ser imposta, sem tolerâncias.

Por isso, mesmo atendendo à evolução da Humanidade ao longo dos tempos, a aceitação da liberdade religiosa tem vindo a reboque, mesmo na cauda de muitas outras liberdades adquiridas.

Uma notícia do Público de ontem, dava conta de uma «intervenção do Papa sobre “Liberdade individual de consciência” e “liberdade religiosa”. São estes os direitos que o Papa quer ver garantidos por todos os líderes políticos e religiosos e que hoje sublinhou durante o primeiro fórum de católicos e islâmicos que decorre no Vaticano.»

Um fórum entre islâmicos e católicos, no Vaticano é, por si só, uma grande notícia, embora a imprensa mundial não tenha dado ao acontecimento o desenvolvimento que merecia, provavelmente prejudicada por acontecimentos concomitantes muito mais mediáticos. Durante muitos séculos estas duas religiões têm vivido de costas voltadas uma contra a outra, tendo originado, em todo o mundo onde se confrontaram, com intransigências radicais, guerras, mortes, julgamentos e segregações que agora nos parecem absurdas.

Por essa Europa fora e o Médio Oriente, as guerras e latrocínios de pendor religioso ensanguentaram os países e levaram a miséria, a destruição e a morte às populações, motivos religiosos que hoje achamos puras futilidades.

Também em Portugal isso aconteceu de forma cruel e desumana que a simples caridade cristã desaconselhava, umas vezes como apoio e aproveitamento do poder civil, outro com base num enorme radicalismo religioso. Ainda se vêem por aí, em muitas cidades e vilas portuguesas, vestígios bem conservados de segregação, nas judiarias e nas mourarias.

Só há poucos anos o Papa João Paulo II retirou aos judeus o estigma de causadores da morte de Cristo e ainda há uns escassos trinta, por exemplo, não existia aprovação legal para a o funcionamento de locais de culto para os islamitas, os infiéis em nome dos quais foram decretadas as Cruzadas, sendo com a ajuda de cruzados que D. Afonso Henriques conseguiu conquistar a cidade de Lisboa. Também em nome desses princípios religiosos Portugal se envolveu nas campanhas do Norte de África que terminaram, praticamente, com a desastrosa batalha de Alcácer Quibir.

Pensando bem, não deve ter havido nenhum profeta ou fundador de uma grande religião que tenha pregado, a frio, qualquer guerra entre religiões. Não obstante, os seus seguidores aproveitaram-se habilmente de algumas expressões, ou das registadas nos «livros sagrados», interpretadas em sentido literal ou conforme as conveniências, em favor de soluções radicais de conversão ou eliminação dos incrédulos, dos ateus, dos infiéis, dos hereges, dos traidores, dos simples opositores de momento, mesmo apenas de alguns detentores de mordomias apetecíveis, onde a religião e a política muitas vezes se fundiram, ou se confundiram, na execução de planos que hoje consideramos autênticas barbaridades.

Há que saudar este fórum, como uma tentativa de pôr uma pedra em cima dum passado que só envergonha a Humanidade, não para que o esqueçamos pura e simplesmente, mas para que saibamos extrair dele as lições que há muito se impunham.

Hoje, finalmente, parece-nos consensual que a palavra religião deve ser sinónimo de liberdade, tolerância, paz e respeito mútuo, acabando de vez com as ideias peregrinas de imposição ou domínio pela força que vigoraram noutros tempos. Oxalá os islamitas também assim o compreendam e todas as outras religiões ou seitas, no Mundo Inteiro.

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