sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

CARNAVAL TODO O ANO


Seriedade por um dia

Agora, que o Carnaval, ao que consta, está a chegar, ocorre-me perguntar se o calendário que vigora em Portugal não estará equivocado, porque todos os dias assistimos às palhaçadas mais incríveis, feitas pelos actores mais variados e insuspeitos, nos locais mais diversos e assumidamente tidos como improváveis.
Hoje mesmo, depois de assistir a mais uma dose gigante de folia burlesca, senti que estava a ficar enjoado sem remédio. O excesso fez-me perder o inicial e saudável desejo de sorrir, suprimindo igualmente a minha própria voz crítica.
Por isso, agora, embora possa parecer anacrónico, até estou de acordo.
Acho muito bem que o povo se divirta, nem que seja, ao menos, uma vez no ano.
Que lance foguetes e se mascare daquilo que não é, para se disfarçar daquilo que é, e vice-versa!
Que gaste o que não tem, para parecer que tem muito.
Que faça barulho ensurdecedor, para transformar em ruído aquilo que durante todo o ano ruminou em silêncio, não foi nem é capaz de dizer a ninguém, com medo de incomodar!
Que tire a barriga de miséria, mesmo por um dia, para enganar os fiadores e preparar-se para o jejum obrigatório do resto do ano!
Que se arme, na terça-feira, em palhaço gigante de cabeça gorda, para ultrapassar, ao menos no seu íntimo, a mesquinhez, o corpo e a alma de fuinha que mostra diariamente aos seus concidadãos!
Que atire aos quatro ventos serpentinas e papelinhos de cores, para que todos possam imaginar como é possível sair da tristeza que incuba durante o ano inteiro, no seu mundo a preto, sem branco à vista!
Que corra, que salte, que se mostre activo até ao exagero, para contrastar com a preguiça e o abandono que nega sempre, e o invade de manhã à noite!
Que cante, que berre a plenos pulmões, tentando mostrar que o seu silêncio de todo o ano é pura falácia!
Que insulte os grandes, os poderosos, aqueles de quem não gosta, já que passa o resto do tempo a bajulá-los, de espinha vergada e sem vergonha!
Que e emborrache, e transborde de alegria sem limites, a tratar de demonstrar que é falsa aquela enorme tristeza que lhe vai permanentemente na alma!
Que mostre em tudo o que fizer durante a quadra carnavalesca, aquilo que não foi capaz de fazer, mas deveria ter feito, ao longo do ano inteiro!
Enfim, que se esforce por ser o que sempre quis ser e não foi capaz de concretizar, isto é, de ser feliz, ao menos por um dia!
Porque assim, deste modo, à custa de um dia de Carnaval calendarizado, assumiremos todos, anualmente, as enormes capacidades histriónicas e burlescas que este mesmo povo tentou a esconder, sem o conseguir, durante trezentos e sessenta e cinco dias, por mais de oito séculos...
Ao menos por um dia ao ano, haja seriedade!

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O Meu Discurso do Estado da Nação

Caros concidadãos:
Há três meses que não escrevo duas linhas no blogue.
Uma hora atrás, recém-chegado do consultório médico e mais deprimido ainda pelas patacoadas lidas na sala de espera, fui tentado a escrever o meu próprio Discurso do Estado da Nação e mandar algumas sentenças ao pagode, como agora é o costume de qualquer gato-sapato que se preze, quando me lembrei de que a República era mais velha que eu, vinte e duas primaveras, devia saber muito mais coisas e não precisava dos meus conselhos para nada.
Lá mais para diante, vão ter lugar, efectivamente, as comemorações dos cem anos da República, o que não impede que, antes disso, vá comemorar as bodas de ouro do meu casamento, coisa rara nos dias de hoje, se não houver pelo meio, os tropeços que a idade e outras mazelas nos mandam, como sentenças que não perdoam. Serão comemoradas com a parcimónia, a sobriedade, o carinho e a alegria possíveis, no convívio da família, gente honrada, trabalhadora, em que os mais velhos são credores de bons exemplos aos mais novos, a geração dos portugueses de amanhã.
O Estado da Nação é calamitoso, no seu centenário mas, apesar disso, devemos comemorá-lo com o brilhantismo de que formos capazes. A República merece. Ela não tem culpa dos desvarios dos seus filhos que, como crianças crescidas na fase de transição para a adolescência, são incapazes de assumir as culpas das suas travessuras, tratando de fazer crer que os culpados são sempre os outros. Os filhos da República não foram capazes de crescer mentalmente, nestes cem anos, não obstante o analfabetismo quase total já ser coisa do passado.
Lembro-me perfeitamente, apesar da idade provecta, das travessuras da minha turma do liceu e dos inquéritos sempre inconclusivos que vinham depois, e só serviam para nos fazer sorrir, tal como hoje acontece nos grandes desvarios da vida nacional. Como podem ver, o mal vem de longe…Mas a comparação termina aqui. A vergonha acabava também por aparecer mais tarde, e quase todos a tínhamos como um castigo merecido. Ainda hoje sinto pena das vítimas de algumas dessas travessuras feitas há sessenta e tal anos, apesar de verdadeiramente inofensivas. Ora, como hoje parece que já não há vergonha na cara de ninguém, o estado calamitoso da nação não tem autores porque, lá diz o velho ditado popular, quem não tem vergonha, todo o mundo é seu!
Receitaram-me, os médicos, uma terapêutica de choque, com o único objectivo de prolongar a vida por mais algum tempo, já que a cura é impossível. Vou colaborar com eles, sabendo que o fim da linha está cada vez mais perto. Enquanto há vida há esperança.
E, no entanto, uma grande tristeza me invade, não pelos meus problemas pessoais, mas pela descrença de alguns dos nossos republicanos que não acreditam nem em si próprios e, não contentes com isso, tudo fazem para minar o moral dos restantes e denegrir o país perante estranhos. Assim, com gente dessa que só se compraz em destruir, a nação não irá longe. Paralelamente, os partidos e a imprensa entretêm-se em jogos puramente politiqueiros ou na coscuvilhice mesquinha, numa época de grande crise nacional, ajudados por uma Justiça lenta, ineficaz, cada vez menos independente, cada vez menos ao serviço dos cidadãos, cada vez mais preocupada com o seu ego. Parece que todas estas personagens, defendendo ao extremo as suas teimosias ou interesses, privados ou corporativos, não desejam entender-se e colaborar na terapêutica de que a nação tanto precisa.
A maioria dos cidadãos, justificadamente, vai perdendo a sua confiança nessa gente. Mas, por sua vez, também não se esforça por aí além e pratica até, a nível menor, os mesmos vícios e desmandos daqueles que deveriam dar o exemplo...Como em épocas remotas, os místicos esperam um milagre, ou aguardam pacientemente a chegada de um qualquer D. Sebastião, enquanto outros, menos imaginativos, anseiam pelo regresso de novo Marquês de Pombal, ou até de um segundo Salazar, para acabar com o regabofe dessa rapaziada fina; desejariam impor já e pela força a tal terapêutica de choque necessária que todos os portugueses exigem mas que nenhum dos maiorais se atreve a fazer aplicar, porque os minorais não fazem a mínima tenção de cumprir...
Cobardes! São todos uns cobardes!
Todos, não!!!
Se fossem como eu, aceitavam humildemente o remédio difícil de tomar, com força de vontade e sorriso nos lábios, e não perdiam tempo em discussões estéreis. Poderia recomendar-lhes, sobretudo, que não fossem apenas derrotistas ou más-línguas, que abdicassem das suas prerrogativas e mordomias, que se deixassem de birras e se portassem como homenzinhos, que fizessem algo, por fim que tivessem esperança em melhores dias… mas é lá com eles.
O certo é que nunca vi um doente desesperado de espírito melhorar ou curar-se fisicamente. Por isso, caros concidadãos:
Vou para a minha esperançosa terapêutica de choque, e termino o meu Discurso do Estado da Nação dizendo simplesmente adeus a todos, tristemente, porque sinto que as minhas palavras serão metidas em saco roto…
Aos numerosos irresponsáveis do nosso país sugiro que, ao menos, evitem brindes com whisky e regressem ao tradicional mata-bicho dos tempos de penúria. Desejo-lhes, com sinceros votos de regeneração a curto prazo,
-Saúde e bichas! *

*Para quem não saiba, bichas são as lombrigas, afugentadas provavelmente com um cálice de bagaceira, tomado antes do pequeno-almoço, no antigamente…)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

CABELO BRANCO É SAUDADE


Os homens são uns malandros!

Mais um estudo, igual a tantos outros, vem hoje publicitado na Comunicação Social. Pretende demonstrar que são os genes os principais responsáveis pelos cabelos brancos que se vão adquirindo ao longo da vida e que o stress ou a dieta pouco interferem nesta equação, ao contrário do que muita gente pensa.
Ora eu, que sou um ignorante em matéria de cabelos, sejam brancos, pretos ou oxigenados, fiquei a saber, sem margem para dúvidas, que tudo o que até aqui se vem dizendo a este respeito, pelo mundo fora, desde tempos imemoriais, deve ter sido uma invenção de Matusalém transmitida através de gerações incultas, tanto mais que, na época do várias vezes centenário patriarca bíblico não havia universidades nem estudos, nem outras fontes de conhecimento avançado que permitissem à meia dúzia de humanos carecas e barbudos seus compatriotas concluir outra coisa ou o seu contrário. De facto, filosofando um pouco sobre este tema, nem mesmo outra conclusão diferente Matusalém poderia ter sugerido ao mundo porque, no seu tempo, não havia computadores, nem stress, nem Mac Donald´s, e as dietas, se existiam, não eram naturais, mas naturalmente provocadas pela eventual escassez de alimentos, ou mesmo pela fome acidental. Interiorizou e legislou para s vindouros que as dificuldades e as amarguras da vida eram a causa dos cabelos brancos…Só nos nossos dias é que nasceram os stresses e as dietas.
Por outro lado, desde que a descodificação do ADN entrou na berlinda do nosso quotidiano, nada haverá que não seja atribuído aos genes ou às suas potenciais combinações, por cientistas (cada vez em maior número) ou simples cavadores de enxada (quase em vias de extinção).
Para mim, este estudo só peca, pois, por defeito, porque o interessante seria a identificação do gene ou combinação de genes responsáveis pelo aparecimento dos cabelos brancos. E, chegados a este ponto, verificamos que os autores do tal estudo (parece que a maioria era de mulheres) não tiveram estaleca para tanto, e se quedaram pela trivial conclusão agora publicitada num conhecido periódico, entre artigos de caça à droga, violência doméstica ou fofoca do Face Oculta.
Mas foi assim, através da leitura da notícia, que me lembrei de um fado velhinho que o malogrado Alfredo Marceneiro cantava, mesmo sem estudos literários ou outros quaisquer, incluindo o da própria guitarra que o acompanhava, «cabelo branco é saudade» … Nunca foi desmentido, que eu saiba.
A sorte dele e dos actuais fadistas, aliás, é que os fazedores de estudos, que hoje pululam por aí, não gostam nem percebem nada de fado. E, sendo assim, poderão estar descansados. Mal fora, se algum destes investigadores se lembrasse de estudar a relação dos cabelos brancos com a saudade, para concluir, cheio de glória, que isso não passava do efeito de um maldito gene…
Mas há maduros capazes de tudo.
Os genes originam coisas engraçadas, a par de outras que não têm graça nenhuma. Um amigo que conheci, com cabelo mais retinto que a graxa com que tingia os sapatos, foi vitimado por uma terrível doença que, em curtos anos, os deixou quase da cor da cal da parede. É mais que sabido que certos agentes químicos utilizados em terapêutica, em casos como este e outros, podem provocar a descoloração do cabelo ou mesmo o aparecimento de brancas.
O estudo a que me refiro, contudo, foi realizado, segundo a notícia, em duzentas irmãs gémeas, homo e heterozigóticas, de idades entre os cinquenta e nove e os oitenta e um anos, sendo que, segundo uma investigadora, os resultados apenas nas falsas gémeas destoavam um pouco, o que era natural. Porém, a estudiosa, cientista e dermatologista britânica, acrescentava no fim, à cautela, que pode haver excepções…
E assim, ainda não foi desta que os tês biliões de mulheres que há neste mundo ficaram a saber a partir de que idade necessitarão de ir ao cabeleireiro tingir os cabelos, para mudar de visual…
Quanto aos homens, nada é referido, provavelmente porque muitos deles cedo ficam carecas. São uns malandros!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

DA SUCATA À LIPOASPIRAÇÃO

Abusos da estética

As notícias dão conta de que o treinador do Nacional da Madeira está e perigo de vida, depois de ter sido submetido a uma «banal» lipoaspiração.
Este tipo de intervenções está na moda. De há uns anos a esta parte, montes de lipoaspirações são praticadas no nosso país, de tal modo que, especialmente entre as mulheres, fazer uma lipoaspiração é como dizer que vou ali e já volto…
Infelizmente, algumas foram e já não voltaram.
A face oculta destas anomalias, -se é que se pode chamar simples anomalia àquilo que acontece quando executado em cima de outra anomalia que é a vulgarização de uma plástica absolutamente desnecessária, levada a cabo exclusivamente por motivos estéticos, de que não andará certamente afastada a cumplicidade e ganância de alguns executantes menos sérios -reside provavelmente na existência na medicina, como na Política, como na Justiça, como em todas as profissões, de autênticos sucateiros.
Longe de mim tentar denegrir esta profissão que agora está na moda tomar como paradigma para tudo o que de mau venha a lume, por uma imprensa aberrante de sensacionalismos oportunistas, na ânsia pura da sobrevivência ou de fazer negócio, muito mais do que informar simples e honestamente o público. Agora, por exemplo, estão também na moda, pelos maus motivos, os sucateiros, como ontem estiveram os habitantes da Pedreira dos Húngaros, da Bela Vista, do Aleixo ou da Cova da Moura e por aí fora, estigmatizados desde então para cá com um ferrete de que não conseguirão libertar-se, nos próximos cem anos! Ora, sucateiros há muitos e dignos, exercendo uma profissão tão digna como qualquer outra, e o crime de um sucateiro transviado não poderá ser transferido para o seu mister e generalizado de ânimo leve a todos os outros, como se fosse um bando ou uma quadrilha organizada de malfeitores, imagem que é passada aos leitores subliminar e inconscientemente.
Quando chamo sucateiros a alguns profissionais, ressalvo, pois, que não pretendo denegrir aqueles, mas simplesmente dizer que alguns destes não estão à altura das suas responsabilidades na defesa da vida humana e nada mais, coisa que aos homens da sucata não pode exigir-se no mesmo grau.
Várias mortes têm sido anunciadas, na execução da técnica de lipoaspiração, algumas talvez acidentais, mas outras por mera incúria, rotina ou até um certo facilitismo que tende a atribuir a um acto médico desta natureza um alto grau de banalidade inócua. Numa das mortes, por exemplo, averiguou-se que o operador era um habilidoso especialista de Urologia! Muitos dos lipoaspiradores não são especialistas, como reconhece a Ordem dos Médicos, e há já um rol de histórias lamentáveis, na própria Ordem e na Deco. A Justiça, pelo seu lado, parece nunca ter culpado ou penalizado quem quer que fosse.
Não sei o que haverá influenciado o treinador do Nacional, no sentido de efectuar a liposapiração. Mas, muito provavelmente, terá pesado na decisão uma opção estética doentia e o facilitismo de quem o induziu a tomá-la ou a praticou. Num mundo cada vez mais regido por problemas de economia, vulgo lucro criminoso, e pelo abuso de padrões de beleza completamente aberrantes, em prejuízo dos verdadeiros cânones da Moral e da Estética que nos regeram durante milénios, tudo é possível acontecer.
Com a extensão da globalização a Portugal, já vimos médicos ucranianos a fazer de trolhas e portanto, não deverá surpreender-nos agora ver sucateiros a fazer de médicos. Só que, neste caso, a gravidade dos erros cometidos é muito maior…
Não dá para fazer humor negro com estas situações tão bizarras quanto trágicas, mas é caso para lembrar a notícia de um crime hediondo que fez parangonas na Comunicação Social, há uns dias atrás, segundo a qual índios semi-selvagens andinos assassinavam compatriotas para lhes extrair gordura, a negociar eventualmente com laboratórios de cosmética europeus. Se a moda pega por estas bandas, sobretudo depois da vulgarização campeã do fast food, muita gente não escapará.
Pela minha parte, jamais me apanharão. Nem que tenha que morrer de fome!
Não sei se o caso que ocorre com o treinador do Nacional se deve a descuido, a erro de rotina, ou a puro acidente imprevisto mas, desde já, faço votos para que ele escape desta.

sábado, 10 de outubro de 2009

SONDAGENS AOS MOLHOS


A corrida aos comentários

Amanhã irá ter lugar mais uma votação nacional, de acordo com o estrito cumprimento da constituição portuguesa. Ainda bem que assim é e que a democracia se mantém em pleno funcionamento.
Até aqui, nada de novo.
A novidade é que as sondagens postas em prática nos actos eleitorais, passaram, pouco a pouco, de esporádicas a frequentes, quase constantes. E, como as suas margens de erro vão diminuindo, com o aperfeiçoamento das técnicas de execução, qualquer dia já não valerá a pena fazer votações, a não ser para esclarecer um ou outro escrutínio mais duvidoso.
Claro que estou a brincar com o tema. Por mais sondagens que sejam feitas, por mais certeiras que venham a mostrar-se, elas não deixarão nunca de ser sondagens., embora, na sombra, possam influenciar muitas decisões políticas governativas ou autarcas. Mas também, algumas vezes, os resultados finais acabam por ser bastante discordantes das previsões anunciadas, tal como se verificou nas europeias (e depois nas legislativas deste ano), quando foram antecedidas de uma semana ou alguns dias apenas, do acto eleitoral. Pessoalmente, não creio que os eleitores mudem de cor de um dia para o outro. Aceito que alguns erros de apreciação devem ter ocorrido.
E, no entanto, há que atribuir certa credibilidade às sondagens, de um modo geral, se não são encomendadas pelo marketing de entidades interessadas, caso em que haverá que dar-lhes algum desconto. Estarei a exagerar?
Outro problema que se coloca nas sondagens, por mais honestas que sejam, é que cada periódico, de acordo com a sua tendência ou orientação político-profissional, dá maior ou menor relevo às sondagens, colocando-as em letra de forma na primeira página, ou em letra miudinha em página de interior, de acordo com as circunstâncias.
Interessantes são também os resultados das sondagens, poucos minutos depois de encerrado o processo eleitoral, cada vez mais próximas dos resultados reais que irão ser anunciados. Acredito piamente que também desta vez, com as autárquicas, as previsões, pouco depois de encerradas as urnas, não irão divergir muito do escrutínio eleitoral efectivo.
Pondo de parte as previsões, não quero deixar de fazer a minha apreciação sobre dois ou três aspectos da votação que vai ocorrer amanhã.
Em primeiro lugar, penso que os eleitores portugueses irão, mais uma vez, saltar por cima dos alarmes moralistas postos a circular, relativamente a alguns candidatos de diversas forças políticas, mesmo que já tenham sido pré-condenados pela imprensa, pelos partidos, ou até pela justiça. Eles irão premiar, com toda a certeza, a obra feita, pouco lhe importando as meras suspeitas de fraude, ou mesmo o roubo provado do erário publico, praticado pelo candidato da sua simpatia!
Em segundo lugar, aposto que pouco interessará aos eleitores que o «seu» candidato tenha publicado uma lista maior ou menor de apoiantes, de maior ou menor peso social ou político.
Em terceiro lugar, creio ainda que serão reconduzidos, de uma forma geral, todos os autarcas que tiverem feito um mandato a gosto, confirmando o facto, já bem enraizado, de que o principal motivo de reprovação de um candidato não é o conjunto de promessas eleitorais feitas pelos opositores ou a má-língua contra eles, mas a deficiência no desempenho que está a terminar.
Por último, as campanhas dos candidatos, à semelhança das legislativas, não primam pela discussão exaustiva dos temas mais importantes, decorrendo o tempo que antecipa as eleições, num clima de mera propaganda.
Independentemente das sondagens aos molhos, ou de todos os anacronismos que possam ter-se verificado durante o processo eleitoral, oxalá, ao menos, os resultados venham a mostrar uma diminuição da abstenção às urnas. Seria um bom sinal para a democracia portuguesa.
Tudo o resto, com mais ou menos comentários, será o trivial!

A corrida aos comentários

Amanhã irá ter lugar mais uma votação nacional, de acordo com o estrito cumprimento da constituição portuguesa. Ainda bem que assim é e que a democracia se mantém em pleno funcionamento.
Até aqui, nada de novo.
A novidade é que as sondagens postas em prática nos actos eleitorais, passaram, pouco a pouco, de esporádicas a frequentes, quase constantes. E, como as suas margens de erro vão diminuindo, com o aperfeiçoamento das técnicas de execução, qualquer dia já não valerá a pena fazer votações, a não ser para esclarecer um ou outro escrutínio mais duvidoso.
Claro que estou a brincar com o tema. Por mais sondagens que sejam feitas, por mais certeiras que venham a mostrar-se, elas não deixarão nunca de ser sondagens.
Também, algumas vezes, os resultados finais acabam por ser bastante discordantes das previsões anunciadas, tal como se verificou nas europeias (e depois nas legislativas deste ano), quando foram antecedidas de uma semana ou alguns dias apenas, do acto eleitoral. Pessoalmente, não creio que os eleitores mudem de cor de um dia para o outro. Alguns erros de apreciação devem ter ocorrido.
E, no entanto, há que atribuir certa credibilidade às sondagens, se não são encomendadas pelo marketing de entidades interessadas, caso em que haverá que dar-lhes algum desconto! Estarei a exagerar?
Outro problema que para mim se coloca nas sondagens, por mais honestas que sejam, é que cada periódico, de acordo com a sua tendência ou orientação político-profissional, dá maior ou menor relevo às sondagens, colocando-as em letra de forma, na primeira página, ou em letra miudinha, em página de interior, de acordo com as circunstâncias.
Interessantes são também os resultados das sondagens, poucos minutos depois de encerrado o processo eleitoral, cada vez mais próximas dos resultados reais que irão ser anunciados. Acredito piamente que também desta vez, com as autárquicas, as previsões à boca das urnas, ou pouco depois, não irão divergir muito do escrutínio eleitoral efectivo.
Pondo de parte as previsões, não quero deixar de fazer a minha apreciação sobre dois ou três aspectos da votação que vai ocorrer amanhã.
Em primeiro lugar, penso que os eleitores portugueses irão, mais uma vez, saltar por cima dos alarmes moralistas postos a circular, relativamente a alguns candidatos de diversas forças políticas, mesmo que já tenham sido pré-condenados pela imprensa, pelos partidos, ou até pela justiça. Eles irão premiar, com toda a certeza, a obra feita, pouco lhe importando as meras suspeitas de fraude, ou mesmo o roubo provado do erário publico, praticado pelo candidato da sua simpatia!
Em segundo lugar, aposto que pouco interessará aos eleitores que o «seu» candidato tenha publicado uma lista maior ou menor de apoiantes, de maior ou menor peso social ou político.
Em terceiro lugar, creio ainda que serão reconduzidos, de uma forma geral, todos os autarcas que tiverem feito um mandato a gosto, confirmando o facto, já bem enraizado, de que o principal motivo de reprovação de um candidato não é o fraco conjunto de promessas eleitorais feitas, ou a má-língua contra os seus opositores, mas a deficiência no desempenho que está a terminar.
Por último, as campanhas dos candidatos, à semelhança das legislativas, não primam pela discussão exaustiva dos temas mais importantes, decorrendo o tempo que antecipa as eleições, num clima de mera propaganda.
Independentemente de todos os anacronismos que possam ter-se verificado durante o processo eleitoral, oxalá, ao menos, os resultados venham a mostrar uma diminuição da abstenção às urnas. Seria um bom sinal para a democracia portuguesa.
Tudo o resto, com mais ou menos comentários, será o trivial!

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

ASFIXIA DEMOCRÁTICA


Partidarismo a mais e bom senso a menos

Estou ansioso pelo fim destas campanhas partidárias por atacado que nos têm dado cabo do canastro. Três actos eleitorais, embora de características e objectivos diferentes, acabam por saturar a cabeça do mais pintado.
Não deveria ser assim.
Trata-se de deveres cívicos que a constituição regula e impõe, e aos quais os cidadãos conscientes e patriotas não podem furtar-se. O problema não é esse.
Dizia um comentarista avençado de determinado jornal que não se revia nas teses de nenhum dos partidos, que pensava pela sua cabeça, que provavelmente até estaria, na política, ao arrepio da maioria dos portugueses, etc., etc.
Ocorreu-me, ao ler essas declarações que, também muito provavelmente, andaria afastado dos partidos porque eles não realizariam aquilo que ele pensava ou desejaria que fizessem. Acontece assim com muito boa gente, até com os adeptos do futebol: deixam de ir aos desafios, quando a sua equipa deixa de ganhar e perde com frequência, ou com os dirigentes do seu clube, quando preparam a chicotada psicológica…
Na verdade, o caso deste senhor comentarista não é único. Há por aí uma caterva de «independentes» abstémios que se julgam de raciocínio mais acutilante e certeiro, que não sentem desejo de submeter-se aos desígnios de ninguém, dos partidos muito menos. Estão no seu pleno direito!
Mas isso não os iliba do dever de cumprir as leis da República, nem do civismo do voto que, nalguns países bem democráticos, até é obrigatório e com multas pesadas para os faltosos. Deveriam saber que a abstenção é a oposição ou a negação do próprio regime democrático.
Quem não concorda com os partidos legais registados, pode sempre tornar-se independente ou votar em branco, mostrando dessa maneira o seu descontentamento aos políticos de serviço. Um elevado número de abstenções deve fazer-nos pensar a todos, nesta postura incorrecta dos eleitores, e não apenas às autoridades políticas.
Outro aspecto bem lastimável destas campanhas mais ou menos carnavalescas que inundam o país de norte a sul (incluindo as Ilhas) é o abuso da «politiqueira», da suspeita, do insulto e da má-língua, em completo detrimento da discussão séria dos verdadeiros problemas nacionais. Parece que a imprensa, os responsáveis político-partidários, os cidadãos, todos ficam embriagados por esta onda burlesca que lhes tira a capacidade de raciocínio, o seu próprio senso comum.
Ora, como se isso fosse pouco, os fala-barato do costume inundam o terreiro da luta de puros conceitos anacrónicos de marketing puro, completamente ocos, enchem paredes, ruas e estradas de enormes cartazes inócuos, aberrantes, e as caixas de correio de papel para o lixo, na sua ânsia de caçar os votos dos indecisos ou papalvos. Os indecisos não serão convencidos desta maneira, e cada vez há menos papalvos, em Portugal.
O certo, infelizmente, é que todos pagamos com língua de palmo, este carnaval de disparates porque, além do mais, muito antes das eleições, a grande maioria dos portugueses tem já a sua opinião formada, e sabe que vai votar em quem muito bem entende, dentre os manequins sugeridos nos anúncios ou nos pasquins de circunstância.
Não falando das incidências lamentáveis, das intrigas de circunstância ocorridas entre políticos, partidos e governantes, onde tudo é dito ou apenas sugerido, verdadeiro ou falso, onde cada qual afirma, mente, desmente, declara, esquece, escuta, julga, imagina, suspeita, acusa, vangloria ou afunda tudo e todos, não posso deixar de rir do slogan posto a correr e explorado por certa força política, a asfixia democrática.
Que factos, além desta «politiqueira» de baixo nível, serão capazes de comprovar esta asserção ridícula?
O que verdadeiramente asfixia a democracia autêntica são as intrigas político-partidárias ampliadas sempre em épocas eleitorais, as propagandas carnavalescas e sem nível, mostradas ao cidadão comum envoltas na roupagem de um falso patriotismo. Já cansam, e não convencem ninguém. Sinceramente, começo a estar asfixiado (bem como a maioria dos portugueses, estou convencido), por este verdadeiro tsunami de parvoíces.
Num regime ditatorial, sim, os seus autores há muito tempo já teriam sido asfixiados, sem soltar um queixume…
Há simplesmente partidarismo a mais e bom senso a menos, em Portugal

terça-feira, 6 de outubro de 2009

COMEMORAÇÔES ÀS AVESSAS


A República não idealizada

Quando uns quantos idealistas, descontentes com a situação do País, nos estertores da Monarquia, conseguiram implantar a República, em 5 de Outubro de 1910, estavam longe de imaginar o que viria a seguir.
Efectivamente, o regime imposto aos portugueses atravessaria numerosas vicissitudes, sobretudo de natureza social, política e económica, mas nunca esteve verdadeiramente em causa a sua própria sobrevivência, mesmo após as investidas de Paiva Couceiro, ou na época do Estado Novo em que as liberdades fundamentais foram cerceadas.
Recuperados, depois do 25 de Abril, os ideais democráticos abafados durante 48 anos, estabelecidos laços económicos, políticos e sociais duradoiros com os restantes países da CE, parecia que a Nova República tinha encontrado o caminho para uma fase de estabilidade governativa que a Primeira República desconheceu, por razões de vária ordem. Não há dúvida de que o caminho percorrido, nesse sentido, foi imenso.
No entanto, de vez em quando, ultrapassando a cordura e o civismo que se impõem nas naturais divergências políticas, algumas aberrações afloram, aqui e ali, nas esferas governativas da Nação, provenientes de radicalismos pessoais ou partidários, nem sempre morigerados a tempo, nem sempre ultrapassados, como deveriam sê-lo, pelos superiores interesses nacionais. As intrigas postas a correr por uma imprensa ávida de fofoca, ou simplesmente transformada em veículo aproveitado por partidos ou interesses pessoais, criaram, a pouco e pouco, um clima de desconfiança mútua entre os principais actores políticos e de laxismo cívico entre uma grossa fatia da população, de que é mostra a abstenção cada vez maior, nas urnas onde se escolhem os responsáveis administrativos e governativos da Nação.
Ontem, mais uma vez, desde o 25 de Abril, se comemorou a data da implantação da República. Sempre de forma pífia, cada vez mais pífia a cada ano que passa. Apesar das enormes dificuldades porque passou o regime, durante quase um século, os idealistas de 1910 não mereciam isto.
Como num jogo de capelinhas teimosas e envergonhadas, Presidência da República, Governo e Câmara de Lisboa resolveram fingir, numa comemoração sem brilho, sem patriotismo, sem alegria, mesmo sem grande espírito cívico. Uma birra pura e simples impediu a comemoração tradicional no local da própria proclamação da República (mesmo com justificação duvidosa), com a presença do Presidente. Uma birra pura e simples impediu o Presidente de dizer duas palavras de apelo ao civismo e ao patriotismo dos portugueses, sem farpas, recados ou segundos sentidos encobertos. E manteve calados, num acto sem brilho, o Chefe de Governo e o Presidente da Autarquia. Na verdade, não eram exigidas palavras de apologia ou crítica partidária, mas apenas de enaltecimento do facto a comemorar, e das qualidades cívicas dos seus autores e do povo português.
Pelo contrário, ocorreu em frente do Palácio de Belém, uma parada reduzida da Guarda Nacional Republicana pretendendo render homenagem a uma bandeira que teimosamente caiu três vezes, durante o desajustado discurso do Presidente, no qual não faltaram alguns recados disfarçados aos seus eventuais inimigos políticos de estimação.
Também em frente ao Palácio Municipal, onde o símbolo da República se manteve hasteado, uma ridícula parada de bombeiros fez a guarda de honra, com a presença do Primeiro-Ministro e do Presidente da Câmara em exercício, escutando o discurso pindérico de uma vereadora e Presidente da Assembleia Municipal.
Episódios tristes (uma autêntica comemoração às avessas), talvez resultantes de uma zanga politiqueira que colocou os intérpretes voltados do avesso, mas que a maioria dos cidadãos desaprova. Tenho a sensação de que eles, se pudessem, apresentariam um cartão amarelo aos actores políticos desta peça em dois actos, na qual os superiores interesses da Nação foram subvertidos aos meros interesses pessoais e partidários, sem respeito pelos eleitores.
Os Pais da República, se viessem de novo a este mundo, sentiriam vergonha pela fraca comemoração dos ideais republicanos feita pelos intérpretes de serviço, os mesmos que tanto se fartam de citá-los ao Povo, mas que tantas dificuldades levantam ao seu cumprimento.
Algo falta a estes responsáveis de uma República não idealizada pelos seus fundadores, quando a proclamaram. Talvez necessitem um pouco mais de bom senso e de civismo puro, para se distanciarem das tricas, dos mexericos, das intrigas politiqueiras em que estes logo se afundaram, maus exemplos que infelizmente continuam a ser moda, quase cem anos depois…
Viva a República!