domingo, 31 de agosto de 2008

PORTUGAL E O FUTURO

Sejamos positivos!

Pouco antes do 25 de Abril, o General Spínola, um dos mais hábeis comandantes da Guerra Colonial, desiludido talvez com a escalada das operações e o rumo dos acontecimentos no terreno, sem fim à vista no campo militar, começou a magicar na forma de acabar honrosamente a contenda, propondo uma tese a desenvolver pelos políticos. Escreveu então um livro, Portugal e o Futuro, que o regime que governava na altura achou perigoso para a sua persistência de defesa e manutenção, a todo o custo, do Império, a Pátria Multirracial e Pluricontinental legada pelos nossos maiores.

Infelizmente, as teorias expostas pelo General estavam já muito atrasadas no tempo, para que pudessem vir a ser postas em prática, mas o livro teve o condão de espevitar a Nação para o levantamento das Caldas da Rainha, em 11 de Março de 1974, precursor da revolução vitoriosa de 25 de Abril, a qual acabou com o Regime de 1926 e a Guerra Colonial, restabeleceu a Democracia em Portugal e, por certos acontecimentos ocorridos nos dois seguintes primeiros anos, dado o panorama político internacional existente, tornou Portugal conhecido no mundo inteiro!

O regime saído 25 de Abril, apoiado e vitoriado pela grande maioria da população, mas ainda assim denegrido aos olhos de uns quantos saudosistas, veio a pouco e pouco a estabilizar os seus fundamentos e, como tal, o País perdeu lentamente todo o protagonismo revolucionário dos anos 74 e 75, passando à semiobscuridade pacífica sem interesse para o jornalismo dinâmico dos nossos dias.

Em Portugal, hoje, a nível mundial, não se passa nada!

E dessa maneira, embora todos gostemos muito dessa tranquilidade morna e acolhedora, a verdade é que Portugal é pouco conhecido entre as gentes da estranja, apesar dos esforços titânicos de todos os governos democráticos, de todas as campanhas publicitárias postas em curso, mau grado os cinco milhões de heróicos e humildes emigrantes e seus descendentes espalhados por esse mundo fora.

Infelizmente, seja qual for o país de que se trate, os acontecimentos que nele ocorrem só têm grande projecção na imprensa moderna, local ou mundial, se tiverem impacto mórbido negativo nas populações, seja a nível económico, moral, militar, político, religioso, judicial, etc.

Ultimamente, porém, o Desporto tem vindo a ocupar cada vez maior destaque na imprensa, em todo o mundo, facto a que talvez não seja estranho o aumento de competições regionais, nacionais e internacionais nas mais diversas áreas, culminando com os diversos Campeonatos Continentais e Mundiais e, finalmente, com os Jogos Olímpicos.

O valor da imprensa desportiva já é incomensurável.

Os políticos sabem o valor que o desporto tem na propaganda das suas nações e investem cada vez mais, nessa área. O Desporto Amador tem passado célere a Profissional. A publicidade e as somas que intervêm nos negócios desportivos são, por vezes, de uma grandeza que espanta. Alguns desportos, como o futebol, tornaram-se populares, entre as camadas mais desfavorecidas das populações, os seus praticantes logo passaram a ídolos muitas vezes mundialmente conhecidos, pelos seus golos, pelas suas fintas habilidosas, pelo valor incrível das suas transferências, etc.

Contava há dias, um jornalista que, na China, durante os Jogos Olímpicos, ficara surpreendido, porque um popular com quem travara conversa, conhecia muito bem o País: Portugal era a pátria do grande Cristiano Ronaldo, do Deco e do José Mourinho!

Não me surpreendeu nada a referência, pois lembrei-me logo do Eusébio, do Futre, do Paulo Sousa e mais uns quantos cujos nomes ficaram gravados na memória das gentes, por essa Europa e pelo Mundo fora...

Há poucos anos, de visita à Turquia, acontecera o mesmo comigo, em plena Capadócia, e no Bazar de Istambul. Desta vez os heróis portugueses eram o F.C.Porto, ganhador das taças dos Campeões e o jogador Luís Figo, declarado o melhor jogador do mundo, na altura!

Acabo de ler que um outro herói está a despontar no futebol português e mundial: Danny, um jovenzito que se celebrizou no Dínamo de Moscovo e foi transferido, há menos de quinze dias, para o Zenit de S. Petersburgo pela soma recorde astronómica de 30 milhões, a maior do futebol russo!!!

O certo é que o endiabrado e genial compatriota conseguiu a dupla proeza de marcar um golo fabuloso pelo Zenit ao Real Madrid, na Supertaça Europeia, transmitido já milhares de vezes nas televisões de todo o mundo...e ser classificado o melhor jogador do encontro.

Estou todo inchado!

Com estes craques, futebolistas espantosos, Portugal está salvo! Ao diabo todas as crises demolidoras que andam por aí! Acima sempre a nossa autoestima Até rima!...

Já não é verdade o que diziam, em pleno século XIX, certos derrotistas profissionais da elite, que esta é uma Terra de boa gente humilde e tranquila, onde proliferam os preguiçosos, os desgraçadinhos os borrachos, sem habilidade para nada, e por aí fora...

Não é verdade, repito: apesar de uma certa preguiça tradicional, as coisas parece que estão a mudar, com os exemplos da Rosa Mota, do Carlos Lopes, da Vanessa Fernandes. Nas estradas, porém, ainda se encontram alguns bebedores. Mas por aí fora...os portugueses estão a mostrar a sua fantástica habilidade a jogar à bola! Para alguma coisa hão-de servir!

Até já há quem diga que, neste momento, os jogadores de futebol são o nosso maior produto de exportação.

Isso não sei, mas o certo é que são presentemente, como eu próprio pude comprovar, a face visível do País no estrangeiro, os nossos maiores publicitários.

Com crise ou sem crise, Portugal marca presença a nível mundial, coisa que já não se verificava desde ao Guerra Colonial e o famoso PREC, após o 25 de Abril!

Quem disse que o futebol era uma praga?

Sejamos positivos!

OLIMPÍADAS EM PEQUIM-VI

Um certo anedotário ...

Hoje, sendo fim-de-semana, ao ler mais uns quantos comentários de circunstância sobre a nossa representação olímpica não pude deixar de sorrir, intimamente. Porque...

Há gente que se deita a chorar, de cada vez que a sua equipa perde ou a equipa nacional não consegue um bom resultado, o que é apenas fruto da nossa falta de cultura desportiva, e não só!

Também há desportistas que choram de raiva, de desespero pela ingratidão dos resultados obtidos, pela falta de justiça ou erros dos árbitros, pelas condições ou acidentes imprevistamente ocorridos, pelo mal estar físico aparecido na altura mais desapropriada, etc. E há dirigentes desportivos que choram e rapidamente atiram petardos aos políticos de serviço, pelas fracas condições disponibilizadas.

Há os políticos e os dirigentes que não conseguem engolir os maus resultados, quando faziam prever às populações ansiosas grandes vitórias e começam logo a distribuir queixas do comportamento dos atletas que não foram capazes de rentabilizar o que neles foi investido, não se comportando à altura ou com o patriotismo exigido.

E, finalmente, há uma imprensa ávida de notícias, boas ou más, mas com exagero quase sempre das más notícias, com todos os deslizes a serem muito bem explorados, com as entrevistas a serem hábil e tendencialmente conduzidas, por forma a aproveitar ao máximo a fragilidade emocional de quem não conseguiu o objectivo, seja desportivo, administrativo, comercial, político...

Ora a estes jogos olímpicos, no que à parte portuguesa diz respeito, podem facilmente atribuir-se algumas virtudes que a imprensa pouco valoriza:

Em primeiro lugar, nunca foi investido tanto na preparação dos atletas, embora seja questionável se o investimento foi ou não suficiente. Geralmente, quando os resultados não são os almejados, é sempre insuficiente.

Em segundo lugar, nunca Portugal conseguira dispor de tantos atletas com os valores mínimos exigíveis pelo COI.

Em terceiro lugar, nunca o País tivera tão boa classificação geral, no contexto das nações concorrentes.

Ora, este resultado só foi obtido devido ao esforço de anos, de alguns atletas, treinadores e dirigentes, com sacrifício de muitos prazeres da vida e de milhares de horas de trabalho árduo, sabendo eles, à partida, que muito dificilmente ele seria compensado com vitórias, na avalanche de concorrentes presente nos jogos.

As populações, e a portuguesa não foge à regra, é que não querem saber disso para nada! Exigem vitórias a todo o custo, aplaudem, põem nos píncaros os atletas ganhadores e crucificam logo os perdedores, mesmo que enorme tenha sido o seu esforço, mesmo que se tenham afogado só a meio metro da praia! Não é bonito, mas é humano...

Mas para ultrapassar, para compensar estes excessos expressivos, bamboleantes, da mentalidade humana, lá deveria estar a imprensa com a sua cultura, a sua difusão e até publicidade, os seus artigos formativos. No entanto, sem ser desculpa, mas atenuante, ela é feita da mesma massa do comum dos cidadãos que procuraria instruir ou tentar educar...

E assim, funcionando frequentemente ao contrário do que deveria ser, ela explora sobretudo o falhanço, evidenciando, como se isso não bastasse, o fictício, a indecisão, a dúvida, relatando a bizarria, a fofoca, o menos credível, como se de assuntos sérios e indiscutíveis se tratasse:

O responsável do COP ia demitir-se, depois talvez não, no fim parece que já não...

Os políticos, os federativos, os homens do COP previam 5 medalhas de ouro, depois só 4, depois era tudo um desastre e, nos últimos dias, lá vieram duas medalhitas para contentamento das gentes e dos dirigentes...

Os atletas foram considerados do melhor que existia nas suas especialidades, com uma preparação psicológica excelente, com um patriotismo a toda a prova, pois com sorte iríamos arrecadar o que nunca conseguíramos; depois, poucos dias depois do início dos jogos, já se atiravam pedras aos atletas e aos dirigentes pelo seu deplorável comportamento, a sua preparação psicológica tida como um desastre, os meios postos à disposição insuficientes, miseráveis mesmo, o patriotismo exibido como um falhanço ainda maior que o dos resultados, etc.

E, no três últimos dias, a imprensa descobriu a Vanessa Fernandes e o Nelson Évora para encher páginas e páginas de louvores, e levar ao ostracismo os restantes e esforçados atletas que, dentro das sua possibilidades e das contingências ambientais, só tentaram dignificar o país.

A este anedotário não quero deixar esquecido o tratamento a dado a um atleta que, coitado, não pôde fazer melhor e, apertado imediatamente a seguir ao fim da prova, por um jornalista sôfrego, apenas soube dizer, por estas ou outras palavras, que a acção tinha decorrido de manhã...e que, de manhã, estar na caminha é que era bom... não se dava com exercícios matinais, etc. Eu vi e ouvi a entrevista e fiquei logo com a sensação do sofrimento do desportista, com o seu ar de riso falso, e fiz para mim o comentário:

-Estás tramado! Amanhã a imprensa trata-te da saúde!

No dia seguinte, efectivamente, a notícia escrita não revelou a cara do sofrimento risível do tipo e desancou-o de todas as formas e feitios, dizendo dele que era um laxista, exibindo falta de esforço na altura própria, falta de cultura, de posicionamento psicológico adequado ante a imprensa, de patriotismo, etc. Como tinha sido possível o COP ter seleccionado um atleta destes? Durante dias, o pobre foi bombo de festa de comentaristas sérios ou jocosos, em artigos sem conta.

Hoje, passados breves dias sobre o encerramento dos jogos, um conhecido diário soube reconhecer a falha cometida e fez uma entrevista decente, em zona calma, fora da efervescência da competição, colocando os pontos nos ii, fazendo justiça ao desgraçado, arrependido já das palavras que dissera a quente, rindo com vontade de chorar, mas tão hábil e maliciosamente aproveitadas...

Tenho pena que coisas ou situações como estas aconteçam mas, sobretudo, que lhes seja dada a relevância e a distorção que vemos frequentemente por aí.

Como anedota, pode servir!

Ou talvez nem isso...

Também a imprensa se fez eco, por fim, do aproveitamento político dado aos bons resultados de alguns atletas. Não estou a referir-me aos telegramas de felicitação enviados pelo Presidente da República ou pelo Chefe do Governo, mas a outros factos reais, verdadeiras anedotas no repertório de alguns autarcas nacionais promovendo homenagens, abraçando, fazendo discursos de circunstância, com presentes à mistura e até a promessa de colocação do nome do medalhado numa rua do município, etc.

É preciso aproveitar a alegria, a receptividade, a auto estima momentânea e rara das populações geralmente tão tristonhas.

Realmente, situações destas raramente se apresentam aos políticos, mesmo àqueles que nunca foram capazes de dar o mínimo apoio ao desporto e seriam os primeiros a criticar, em caso de fracasso...

Há muito mais, mas já me falta a paciência.

Basta de anedotas, por hoje.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

DESINFORMAÇÃO JORNALÍSTICA

A incrível pedagogia do crime

Estou triste com a informação veiculada ao cidadão pelos jornais diários, as revistas, os canais de TV...

Sempre fui partidário de uma informação completa, sem traumas nem truques, sem subterfúgios, isenta, independente, honesta, pedagógica. O 25 de Abril trouxe ao País uma informação aberta, desinibida, livre de censuras oficiais, como tanto se pretendia. Mas essa liberdade de informação obrigou, logicamente, ao melhor profissionalismo, por parte dos senhores jornalistas.

Creio que esse objectivo nem sempre foi conseguido, ao longo destes trinta e tal anos de democracia, um pouco porque a profissão continua a ser orientada e escrutinada por um Sindicato (que não está em causa), mas os seus membros ainda não tiveram coragem de formar uma Ordem dos Jornalistas, guardiã e zeladora dos seus princípios éticos!

Será por medo a um organismo interno de controlo, impeditivo de atropelos à ética jornalística? Ou será por inércia pura? Ou ainda por simples individualismo?

De tempos a tempos esta questão é levantada pelos cidadãos e até por alguns, raros, elementos da classe, porque a informação atravessa regulamente períodos de exagerada e pura fofoca, desmedida e fútil, publicando em catadupa o que menos importa, em prejuízo do essencial, tantas vezes subvertido na onda oportunista do acessório, do dispensável...Claro, os jornalistas dizem a isto que os critérios são discutíveis e a informação tem sempre a primazia sobre outras considerações. Eles lá sabem.

Em certas ocasiões, contudo, parece que o jornalismo só é capaz de produzir, de noticiar, de engrandecer o que é mau, reproduzindo-o com grandes pormenores mórbidos, comentando-o de forma doentia, abstendo-se de realizar um mínimo de acção formativa e relegando as boas informações para as linhas interiores, em caixa baixa... Dizem que a pedagogia cabe aos professores...

E, como se tal não bastasse, muitos elementos da classe actuam como perfeita corporação no pior sentido, defendendo os seus defeitos até à exaustão, como se de direitos inalienáveis se tratasse. Afirmam que em todas as classes profissionais há bom e mau....

Ontem resolvi dar uma espreitadela a um conhecido diário, dos mais lidos, que o uso da Internet me havia deixado quase no esquecimento. Fiquei simplesmente horrorizado. Da primeira à última página, em maiores ou menores títulos, eram relatados os crimes mais variados, com os pormenores mais esmiuçados, alguns até com as fotografias mais sugestivas. E, a complementar estas notícias extensas, feitas de propósito para encher páginas e páginas, à falta de melhor, em tempo de férias, vinham quase sempre os comentários e as entrevistas mais pífias que tenho visto nos últimos anos.

Fiquei com pena, por dois motivos.

Pela «onda» de crimes que está a assolar o país, sem fim à vista. Pela forma com que a imprensa vem tratando o caso, com uma descrição mórbida e completa, pormenorizada nas cenas de faca e alguidar, como se essa apresentação doentia ajudasse alguma coisa na resolução do magno problema, num aproveitamento do populismo fácil, numa insensibilidade tremenda pela acção pedagógica formadora dos leitores.

Acresce que alguns dos nossos comentaristas encartados também, por vezes, parecem cavalgar o mesmo barco dos simples noticiaristas, o que é ainda mais desolador.

Sabemos todos que a criminalidade e a falta de segurança são uma crescente preocupação das populações e das autoridades e que assuntos como estes e a sua discussão não devem ser escamoteados pelos cidadãos, muito menos pela imprensa. E não devem também ser tratados com a leveza de espírito, a fofoca e o oportunismo comercial, jornalístico -politiqueiro que vemos por aí.

Há poucas horas, um senhor comentarista e jornalista bem conhecido, insurgia-se contra a observação de alguém acerca desta anormalidade que mais parece, pela forma como é conduzida por alguma imprensa, uma disfarçada apologia do crime, com os criminosos a serem (e a verem-se!) publicitados por aí em grande estilo, a custo zero...

Dizia ele assim, em ar de gozo:

«O ideal, no fundo, seria que as pessoas que vivem em bairros inseguros fossem alvo de um ‘black-out’ informativo para que pudessem ser alvos de violência e de assaltos no maior dos segredos – tudo para que poupássemos as nossas elites ao conhecimento das misérias alheias. O Mundo seria mais agradável. No tempo do dr. Salazar, por exemplo, os jornais estavam impedidos de falar sobre crimes. Vemos que, afinal, havia um sentido pedagógico na censura.»

Ora o despropósito deste parágrafo corporativista evidente mereceu-me o seguinte comentário, limitado ao número de caracteres exigido pelo jornal:

«Todos sabemos que o mau serviço prestado ao País não se deve à informação, mas à desinformação e à morbidez dada às notícias! É uma tristeza ver certos diários de referência transformados em perfeitos jornais do crime! Senhores jornalistas, tenham moderação, noticiem tudo, mas com profissionalismo e exerçam a sua «obrigatória» função pedagógica, de que o País tanto necessita.»

Também por vezes, olhando e ouvindo, em certos noticiários televisivos as descrições, as entrevistas patéticas acompanhadas das fotos das armas, dos pacotes da droga, do sangue a correr e das vítimas espalhados na calçada, lembro-me das palavras de Cristo, na agonia da Cruz:

-Perdoai-lhes senhor, que não sabem o que fazem!

E, no entanto, afirmam alguns entendidos que isso faz bem. Que deve ser noticiado integralmente, até à exaustão. Que nos ensinará a enfrentar o monstro...

Como, é que ninguém diz...

Apetece-me, nesses momentos, desligar o aparelho e chorar.

Não por cobardia perante o que vejo, ao contrário do que faz tanta gente fina ou sábia, mas simplesmente por pena, pela minha ignorância pura, pela minha incapacidade de apresentar uma solução que tarda, no meio da confusão de tantas descrições e opiniões audazes, absurdas ou contraditórias, pela minha impossibilidade de fazer coro com elas...

terça-feira, 26 de agosto de 2008

OLIMPÍADAS EM PEQUIM-V

As medalhas queridas

A sessão de encerramento da Olimpíadas, em Pequim, foi quase tão espectacular como a sessão de abertura. A China quis mostrar ao mundo, com estas duas super apresentações, aquilo de que foi capaz, ao longo de mais de dois mil anos, e deixar-nos a todos um aviso para o que será capaz de fazer, num futuro que não será longínquo.

Cerca de um quarto da população da Humanidade está concentrado na China. Ela não poderá mais ser esquecida ou desvalorizada pelos restantes três quartos, como foi durante os últimos duzentos ou trezentos anos.

Também a conquista das queridas medalhas pelos atletas chineses foi uma manifestação exemplar de querer, de eficácia, vindo a ultrapassar a Rússia e os Estados Unidos, países que tinham a supremacia nas olimpíadas, há mais de cinquenta anos!

Portugal, com os seus dez milhões de habitantes, fracas tradições desportivas e ainda mais fracas prestações nas competições internacionais, lá conseguiu duas medalhas queridas, dentre as não sei quantas programadas com a nossa proverbial megalomania, logo a seguir transformada em desespero. Para regozijo de apenas uns quantos, e tristeza infinda dos maledicentes e invejosos do costume, que são a grande maioria da rapaziada nacional, esse ouro e essa prata obtidos foram o resultado real desta nossa participação olímpica, dentro do possível.

Eu bem gostava de aplaudir a conquista de mais umas quantas medalhas, mas a verdade é que, pessoalmente, não fiz nada para que isso acontecesse e também não sou um obcecado por estas coisas. Apenas fiquei triste com a perda do velhinho recorde do Carlos Lopes, na maratona.

Sejamos, no entanto, positivos, deixemo-nos de cantigas ou de choradeiras de última hora. A China conseguiu 100 medalhas mas, com a sua população à volta de 1,5 biliões de almas, deveria ter obtido 300, se a proporção fosse mantida, relativamente ao feito português! Já não me atrevo, é claro, por motivos óbvios, a fazer comparações deste género com outros pequenos países dos mais diversos quadrantes...

Mesmo assim, o coração salta-me do peito.

Somos os maiores...os maiores do 2º quinto dos cerca de 200 países concorrentes, já que ficamos no 40º lugar da classificação geral, ou por aí.

Posso, enfim, dormir descansado.

Viva Portugal!

E daqui a quatro anos, em Londres, lá estaremos a conquistar mais uma ou duas medalhitas...

Vai uma aposta?

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

TRANQUILIDADE

Crime e segurança politiqueira

Na época passada, um respeitável e bem conhecido treinador de futebol ficou célebre pela utilização da palavra tranquilidade a propósito de tudo e de nada, facto que foi aproveitado pelos «Gato Fedorento» para um dos seus programas cómicos mais bem conseguidos da TV.

Os tempos eram outros. De há um ano a esta parte, para ser mais preciso talvez desde o começo deste ano, uma onda de crimes violentos a que não estávamos habituados tem varrido o país, trazendo as populações de certas zonas em sobressalto, de nada valendo as recomendações de tranquilidade que as autoridades tentam fazer passar na Comunicação Social. A verdade também é que esta onda tem sido habilmente cavalgada pelas Magistraturas e aproveitada ou explorada igualmente por essa mesma Comunicação Social, à falta de grandes notícias, com a política em férias.

A Procuradoria e os senhores Juízes, tantas vezes acusados de soltarem os presos, antes da reforma do Código Penal, como de atulharem as cadeias com presos em prisões preventivas por dá cá aquela palha, encontraram no aumento da criminalidade a justificação para a sua não concordância com a reforma do Código. Se dantes eram as populações que se queixavam das suas decisões de soltura dos criminosos entregues pela polícia, no tempo em que o Código lhes permitia encerrá-los na cadeia, para protecção dos cidadãos, agora que o Código restringe certos abusos de utilização da prisão preventiva, encontraram a sua tábua de salvação. A culpa, para eles, é exclusivamente do novo Código Penal e dos políticos que o aprovaram.

Lá se foi a tranquilidade do sistema e das gentes! Parece que essa mesma tranquilidade tomou conta dos criminosos que por aí abundam, tantos como os treinadores de bancada sugerindo soluções para a resolução do problema. Alguns vociferam:

-Prendam os bandidos! Não os soltem! Aumentem as penas!

Outros ainda vão mais longe:

-Ponham mais polícia nas ruas! Dêem-lhe mais autoridade! Que atirem a matar, se for preciso!

-Um partido da Oposição, autor do célebre decreto das Super Esquadras à custa do policiamento de proximidade, deu também a sua opinião abalizada e definitiva para acabar com o crime:

-Demita-se, senhor Ministro!

Os comentaristas que exploram a situação aventam também soluções interessantes:

-Corrijam o novo Código Penal! Aumentem o número de polícias! Reforcem o policiamento das bombas de gasolina, das carrinhas de valores, das agências bancárias, dos tribunais, dos supermercados, dos bairros problemáticos, de tudo o que mexe!...

Estes e outros perguntam e dão a resposta sábia:

-De quem é a culpa? Do governo!

O caricato de tudo isto é que ninguém tem uma ideia, uma só ideia luminosa que possa resolver ou ajudar a resolver este problema. Este ou qualquer outro!

Como em todas as questões que assoberbam o país, os corriqueiros treinadores de bancada proliferam.

Um deles, partidário do Código Penal anterior que dantes criticava asperamente, até gozava com a ausência de férias do «esforçado» Ministro de Administração Interna sempre agarrado ao telemóvel, tentando fazer concorrência aos bandidos nas horas extraordinárias.

Respondi-lhe no mesmo tom jocoso:

«Se eu fosse ministro e seguisse as directivas de todos os treinadores de bancada que por aí abundam, metia meio mundo em prisão preventiva e publicava um decreto a proibir o crime à outra metade que ficasse em liberdade. Era remédio santo e teríamos todos tranquilidade absoluta. Não seria necessário formar mais polícias, e podia mandar o telemóvel às ortigas. Fácil, meu caro Watson!»

Quero apenas acrescentar, a finalizar estas linhas, que não tenho procuração do Ministro ou do Governo, nem pertenço a qualquer partido político. Detesto apenas a politiquice.

Como todos os portugueses, gostaria de ver este magno problema resolvido. Mas, infelizmente, confesso com humildade que não tenho a solução.

domingo, 24 de agosto de 2008

POLÍTICOS

A ambição e o castigo a prazo

Uma estatística recente dizia que «Os portugueses avaliam de forma positiva o trabalho desenvolvido pelo bombeiros (94 por cento), carteiros (89 por cento) e professores da escola primária e secundária (89 por cento). Em quarto lugar, surgem os médicos (87 por cento), seguindo-se os militares (80 por cento) e os polícias (75 por cento).

Só 14 por cento dos portugueses inquiridos manifestaram confiança nos políticos, aos quais deram nota negativa, juntamente com os publicitários (40 por cento), os empresários de grandes empresas (41 por cento) e os banqueiros (46 por cento).»

Mas será que devemos encarar estas afirmações, simplesmente à letra?

A verdade é que os políticos são gente muito especial. Considerados pela população em geral como a nata imprescindível dos executivos de um país, são, simultaneamente, acusados das maiores arbitrariedades, das maiores incompetências, das maiores fraudes, dos maiores abusos, dos maiores roubos...até dos maiores crimes. É caso para dizer que os políticos são os maiores vigaristas existentes à face da terra, necessários, contudo, ao governo das nações. Mesmo assim, são inicialmente queridos das gentes, ganham as votações, são adorados por elas com a mais descarada subserviência, são utilizados com perspicácia para a obtenção de grandes proventos, para a propaganda das maiores vaidades, para a convivência no maior luxo e honrarias, em suma, para a obtenção das maiores benesses...

Também os políticos são usados como motivo de notícia e dos comentários mais diversos por parte dos media que deles igualmente tiram proveito. Servem para fazer as leis do país, para fazê-las cumprir, para revogá-las também, ultrapassá-las, contorná-las, e até ridicularizá-las, às vezes.

Não há nada que um verdadeiro político, na sua ambição, não se julgue capaz de fazer. Mas em breve irá ter a fama de havê-lo feito, sem que isso aconteça...e também exactamente do seu contrário! A imprensa que o diga.

Poderá parecer incrível, à primeira vista, mas é por isso que há tantos cidadãos a querer ser políticos, quase tantos como cidadãos a desejar ser jornalistas, para poder noticiar ou enaltecer os seus próprios feitos nas colunas dos periódicos...ou denegrir os dos adversários! E sempre sob a capa da verdade, política ou jornalística, tanto faz.

Com frequência, pois, os políticos tornam-se jornalistas e estes se transformam naqueles, numa promiscuidade nada saudável. É o que está a dar.

E, pelo contrário, apesar dos louvores subjacentes ao inquérito acima citado, já ninguém quer ser bombeiro, carteiro, professor, militar ou polícia! E ser médico é quase proibido...

Mas que havemos de fazer?

A vida é assim, feita destas incongruências tornadas anseios, destas virtudes tornadas defeitos, destes vícios tornados virtudes obsessivas, desta mescla de pedras preciosas e ovos podres que a sociedade leva aos píncaros ou deita na fossa, mas que não é capaz de ultrapassar pela positiva.

Afinal, bem vistas as coisas, que são os políticos mais que os outros cidadãos? Porque hão de ser melhores ou piores que os outros, se a massa de que são feitos é a mesma?

E que culpa têm eles, daquilo que os acusamos?

Fomos nós que os glorificamos, na nossa feira de vaidades, e logo os levamos ao Céu. Na nossa ingenuidade ou presunção, nós os fizemos deuses.

E, contudo, nós os mandamos, como juízes infalíveis, pouco tempo depois, para o Inferno.

Na certeza de que nunca, nunca nos julgamos culpados do que fazemos, e pretendemos, isso sim, julgá-los sempre pela bitola baixa.

Diz a notícia que só 14% dos portugueses inquiridos manifestaram confiança nos políticos, a quem deram nota negativa...

Serão mais? Serão menos? São muitos ou poucos? Quem garante? Vendo-a conforme a li, num periódico credenciado.

Mas, pela minha parte, não posso concordar com a percentagem apresentada. A mim não perguntaram...

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

OLIMPÍADAS EM PEQUIM - IV

Como foste nessa?

Maria Albertina, como foste nessa de chamar Vanessa à tua menina?

Assim cantava António Variações uma letra eivada de sentimento patriótico que ganhou fama e passou a ser cantarolada por muitas e variadas gentes, no país inteiro.

Na realidade, quantas crianças foram registadas com nomes estrangeirados, em Portugal, fruto desta globalização das comunicações e dos transportes que tudo iguala, tudo nivela, tudo copia, tudo transforma, tudo unifica?

A nossa campeã do triatlo terá sido vítima dessa globalização, porque se chama Vanessa? Os pais, a família acharam o nome bonito e vá de pô-lo à menina, a despeito da popularidade da canção de António Variações, nessa época.

Também eu já conheço diversas Vanessas, coisa impensável nos meus tempos de menino. E quantos outros nomes que nada têm que ver com a antiga nomenclatura, há anos legalmente estatuída e imposta ao Registo Civil, circulam por aí, sem que ninguém fique preocupado com isso?

Nomes de pessoas diferentes dos habituais estão cada vez mais a aparecer como cogumelos, quase ao ritmo dos neologismos que surgem todos os dias nas Novas Tecnologias ou na Informática...para desespero dos puristas da língua portuguesa.

Vão ficar vencidos.

Vencendo o triatlo, onde quer que se apresente a disputá-lo, está a Vanessa Fernandes, fazendo jus a um trabalho persistente de preparação, num esforço altamente meritório. Conseguiu hoje uma medalha de Prata para Portugal, nos jogos Olímpicos de Pequim. É quase como a conquista da China!

Todo o País parou para ver a prova e aplaudiu, no final, o grande feito da Vanessa. Até o Presidente da República enviou, momentos depois, as suas felicitações. E, para quem não teve oportunidade de assistir à prova, na TV, ela foi reposta, repetida em todas as emissoras e canais vezes sem conta, para gáudio dos portugueses entusiasmados, agora já de peito inchado...

Parabéns, Vanessa! Foste adoptada pelos dez milhões de concidadãos tristonhos, famintos e sedentos de êxitos que só esperavam o teu sinal de vitória para explodirem.

Neste momento já ninguém quer saber se o teu nome foi proscrito pelo António Variações, pela Academia ou pela gente fina da nossa praça.

Os teus pais gostaram dele...e pronto!

Também agora, os portugueses gostam dele e de ti...e pronto!

Tudo o resto que vá às ortigas!

Aposto que, de hoje em diante, e muito por culpa da tua simpatia, do teu esforço, do teu feito extraordinário, numerosas meninas serão registadas, por esse país fora, com o simpático nome de Vanessa.

Todo o país vai nessa, não tenho dúvida!

E porque não?

ALGAS EM OLHÃO

Bacalhau na Noruega

Ao ler a notícia seguinte num diário de hoje, fiquei estupefacto e, simultaneamente, cheio de orgulho patriótico.

O caso é que os olhanenses se puseram a cultivar algas, já que cultivar batatas nunca foi o seu forte e, nos tempos de hoje, estava também fora de causa. Na era dos computadores, as algas, segundo eles, serão a única coisa que dará resultado em Olhão, além do atum...e este cada vez menos.

Os fulanos tiveram olhinhos! Além disso, são patriotas por excelência, como diz a canção:

Oh vila de Olhão

Da Restauração...

E agora, com a agricultura tradicional de rastos, lembraram-se de cultivar o oceano que fica mesmo em frente. Neste momento, portanto, fazem agricultura com algas a exportar para a Noruega, onde se ensaia com êxito a criação do bacalhau que, muito provavelmente, acabará por vir parar ao prato dos portugueses e também aos restaurantes típicos, para turista arregalar a vista, satisfazer o apetite e...regalar o estômago.

Sei que também estão criadas as condições, como agora se diz, para outra criação, a dos robalos e douradas, às toneladas, na Ria Formosa, fazendo assim com que os pescadores tradicionais de Olhão, aos poucos e poucos se transformem em agricultores marítimos consumados!

A bem da Nação!

É assim que se começa. Daqui a uns tantos anos, estamos esperançados de que haveremos de comer bacalhau de Olhão, como dantes se comia o da Terra Nova e agora o da Noruega!

Já estamos a ver os naturais da simpática cidade algarvia a gritar de contentamento, fazendo concorrência à canção de Elvas, do Paco Bandeira:

Oh algas, oh algas!

Bacalhau à vista!...

OLIMPÍADAS EM PEQUIM-III

A lição do rei

Um atleta que ganha uma medalha de oiro nos Jogos Olímpicos, nos dias de hoje, é um fenómeno! Mas como devemos classificar um atleta que ganha oito medalhas? Não sei. Talvez um super fenómeno ou, prosaicamente, o rei das medalhas

Há uns cinquenta e tal anos, fui assistir, no Estádio Nacional, a uma sessão de propaganda e promoção do desporto, para a qual haviam sido convocados os melhores atletas do país e convidado expressamente um atleta norte americano, vencedor do pentatlo nas primeiras olimpíadas do pós guerra. Pois nas competições em que entrou, o atleta em referência ganhou todas as provas aos campeões portugueses que com ele haviam sido confrontados.

Isto pode dar uma ideia da dimensão do desporto português, na altura. Uma marca que me ficou na memória foi a do salto à vara que o fulano estabeleceu em 4,51 metros, contra 3,80 do campeão português.

Muito longe estão as marcas obtidas nos tempos de hoje, não só porque os atletas são mais eficientes, mas até porque as varas são de um material extremamente leve e flexível que não existia na altura. Mesmo assim, esta desproporção de valores deixou-me aparvalhado!

Não sei exactamente quantos países concorriam na altura, aos jogos olímpicos. Seriam alguns 50 ou 60, e um total de cerca de mil ou dois mil atletas?..Actualmente, com mais de 200 nações e 6000 atletas a competir, a conquista de medalhas já não é o passeio que era antigamente, muito menos no tempo dos gregos de setecentos antes de Cristo.

Por isso, a conquista de uma medalha de ouro, mesmo de prata ou de bronze é, actualmente, uma coisa cada mais difícil, só acessível, na realidade a atletas de eleição, tanto pela sua condição física, como pelo trabalho exaustivo e persistente de preparação e treino durante anos, exigências que, em muitos casos, há cinquenta anos apenas, para não ir mais longe, nem sequer eram imaginadas.

Também certas artimanhas, como a utilização de hormonas, de anfetaminas e derivados sanguíneos, estão a ser combatidas sem piedade.

Mas então, como é possível um atleta ganhar oito medalhas de oiro, numas olimpíadas?

Como foi possível?

Certamente com muito trabalho, paciência, determinação, persistência, esforço individual, honestidade, privação de muitos prazeres habituais ao longo de vários anos, eu sei lá, numa idade em que todas estas qualidades são esquecidas por tantas apetências que a vida oferece, no objectivo ambicionado da vida fácil, sem sacrifícios...

Sendo assim, como seria fácil, conceber a glória, a soberba, a importância, o orgulho deste rei das Olimpíadas de Pequim, recordista do Guiness, herói do desporto da nação mais importante e poderosa da Terra! Quantos desportistas não invejariam realizar o seu feito? Quantos não se sentem importantes e soberbos, com um simples bronze?

E no entanto, isso que nós os leigos na matéria podemos imaginar, não tem nada que ver com a resposta simples, despretensiosa dum rei de 23 anos apenas, a um jornalista que lhe perguntou, à queima roupa, depois de alcançar a oitava medalha, que sentia, depois da proeza que acabava de realizar:

- «Nem sei o que sinto neste momento. Há demasiadas emoções a passar por mim. Penso que só gostaria de ver a minha mãe».

Aqui está uma lição que dificilmente poderá ser esquecida.

sábado, 16 de agosto de 2008

CEGUINHOS COMPULSIVOS

Meter as cataratas na ordem...

Já em tempos tinha escrito um artigo sobre este país de «ceguetas», onde abundavam as enfermidades do foro oftalmológico sem remédio à vista... porque uma percentagem superior a 65% dos portugueses via mal, segundo uma estatística abalizada.

Mais tarde, escrevi novo texto sobre a eficácia, ou falta dela, dos cirurgiões de Oftalmologia, em Portugal, país de vários milhares de cataratas, dessas que não são atracção turística.

Nessa altura, um jornal diário citava que um médico espanhol efectuava quarenta operações às cataratas, por dia, enquanto os nacionais não iam além de sete, uma vez por outra! Tinha feito já numerosas cirurgias em Elvas, Portalegre e no Barreiro, e o preço rondava 50% destes. Na maioria dos casos, não necessitava de recorrer a anestesia geral.

A Unidade de Saúde de Elvas e Portalegre, onde mais de 1000 operações foram efectuadas em tempo recorde, pensou efectuar uma contratação com o médico espanhol, para acabar de vez com as listas de espera na zona. Foi então que a Ordem dos Médicos de Portugal resolveu intervir, a fazer uma investigação pormenorizada às instalações e aos métodos utilizados, e atrasar o processo, etc., apesar do espanhol que tem clínicas em Badajoz e Mérida, também estar inscrito há oito anos na mesma Ordem!

Os dados mais recentes deste caso são os seguintes:

«O oftalmologista espanhol que em Março realizou 234 operações às cataratas em seis dias, no Hospital do Barreiro, admite apresentar queixa contra a Ordem dos Médicos na Comissão Europeia.

«O médico diz ainda ter em sua posse a cópia do bloco de Janeiro do Hospital do Barreiro onde foram realizadas 39 operações às cataratas em 12 dias, das quais 21 com recurso a anestesia geral. "Isso é que é de Terceiro Mundo e depois admiram-se que eu opere em cinco minutos. É curioso que nenhum colega do Barreiro subiu ao bloco para aprender comigo e agora questionam os meus métodos. Não posso tolerar mais isso."

Também já algumas autarquias tinham começado a subsidiar operações em Havana, devido à incapacidade dos médicos portugueses para resolver o problema das cataratas. E de igual modo a Ordem dos Médicos começara a colocar entraves, lançando a suspeita de incompetência dos cirurgiões cubanos...

Não sou médico e não me atrevo, portanto, a comentar. Apenas, antes de terminar, desejo fazer uma pergunta e apresentar duas constatações.

A pergunta:

Será que os portugueses são obrigatoriamente um povo de ceguinhos compulsivos?

As constatações:

1ªEm terra de cegos, quem tem olho é rei!

2ªEm termos práticos, o que parece evidente, neste caso, é a necessidade urgente de meter as cataratas na ordem e não a Ordem nas cataratas...

FUMAR NA ALCOVA

Caricaturas

O radicalismo é, quase sempre, uma coisa anacrónica na época em que vivemos, em que o pensamento se tornou livre das amarras com que as religiões e os poderes instituídos, cada um à vez ou em simultâneo, tentaram manietá-lo. Por vezes, não sendo possível na totalidade, tentaram fixar-lhe as duas conhecidas talas orientadoras...

As guerras, os genocídios, as forcas, as inquisições, os fornos crematórios e outras propagandeadas maravilhas, são exemplos vivos desse radicalismo que ainda hoje sobrevive por aí, meio oculto, mas sempre pronto a actuar, logo que se lhe dê uma oportunidade.

Mas há um certo radicalismo mais subtil, na mente de muito boa gente, que não tem nada a ver com o que acabo de dizer, mas apenas com o desejo de ver ou fazer triunfar a todo o custo os seus pontos de vista, contra todas as regras de um simples bom senso, tapando mesmo, se possível for, a boca a quem ousa ter opiniões diferentes. Com a fatal e ancestral justificação da sua razão, sempre plena, indiscutível.

As boas normas que hoje se tornaram uma quase obsessão, nas condutas e nos procedimentos técnico-ético-legais, mostram, por vezes, algo desse ancestral radicalismo disfarçado.

Também ao ler certos comentários com que a imprensa nos brinda, de vez em quando, ficamos com essa sensação.

Ora isso não tem nada a ver com o elogio da permissividade, da libertinagem, da fuga à lei ou à justiça que alguns apregoam, sob a capa de defesa dos direitos dos cidadãos. Esse é o outro extremo do leque.

A propósito, não quero deixar de referir que, nos últimos tempos, poucos diplomas legais foram tão denegridos como a «famigerada» lei anti tabaco, aplicada na maioria das nações da Europa Comunitária. Como sempre, os portugueses negaram terminantemente a sua colaboração na elaboração da lei, como é hábito, mas os fumadores logo a criticaram vivamente depois de aprovada, alegando a limitação abusiva da sua liberdade individual. Eles que nunca respeitaram a liberdade individual dos não fumadores, em qualquer lugar onde se encontrassem.

Os comentários mais incríveis foram impressos, caricaturando a lei, os fiscais, o governo, alguns até incentivando directa ou sorrateiramente à desobediência...

Aos poucos, as coisas foram acalmando mas, mesmo assim, alguns comentaristas vencidos ainda lançam alguns petardos como vingança, mais um incentivo tardio à confusão.

Não resisto a transcrever umas breves linhas com que um desses senhores, forte opositor à lei antitabaco, termina hoje o seu arrazoado, num periódico de referência, pretendendo mostrar a incongruência da aplicação da lei, nos hotéis:

«Os cidadãos podem fumar tranquilamente no recato dos quartos, ao abrigo dos olhos inquisidores de algum fundamentalista voluntário ou dos terríveis agentes da ASAE e similares. É por isso que nestes locais interditos a viciados não se fuma pouco. As aparências iludem mesmo.»

E, já agora, aqui vai o curto comentário que lhe enviei e foi censurado, como imaginara:

É evidente que cada um, no seu quarto (de casa ou de hotel), pode fazer o que quiser...até fumar! Só faltava aparecer uma lei a proibir a liberdade na alcova!...

Caricaturas.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

OLIMPÍADAS EM PEQUIM-II

O espectacular banalizado

Já começo a estar cansado das Olimpíadas, em Pequim, apresentadas a toda a hora na Comunicação Social, de tal forma que nem resta tempo para respirar! Fazem-me lembrar Florença com as suas numerosas e espectaculares obras de arte, tantas e tão belas que, aos meus olhos de turista curioso, acabaram banalizadas, ao fim do segundo dia de visita à cidade!!!

Não quero, evidentemente, dizer que não gosto. Pelo contrário, adorei especialmente uma cerimónia de inauguração fantástica sob diversos pontos de vista, ultrapassando tudo o que, desde o começo destes certames, fora realizado até agora. Seria, pois, bem difícil não gostar. Provavelmente não existe mesmo ninguém que não tenha gostado.

Mas o aparato, tantas vezes repetido, das competições, dos resultados, dos comentários, da politiquice e da fofoca subjacentes, acaba por cansar o mais resistente. O bom, como disse, acaba por ser banalizado e o mau sempre explorado pelos oportunistas do costume. O desporto não escapa à regra.

A competição desportiva tem aspectos interessantes e também muitos anacronismos. O desporto não é matemática, como desejam os treinadores dos atletas. Os resultados não são previsíveis como os jornalistas pretendem fazer crer. As emoções dos desportistas são difíceis de controlar. As assistências são sempre exigentes de vitórias e nunca são compreensivas, nas derrotas. O esforço dos atletas, dado o seu número cada vez maior, só raramente é compensado por resultados vitoriosos.

Estas são as principais certezas entre tantas aberrações da época competitiva em que vivemos na qual o desporto amador foi simplesmente desvalorizado e profissionalizado, deixando de ser o que era, e transformando-se quase numa luta de galos pela sobrevivência, outro perfeito anacronismo ante o espírito olímpico feito de fraternidade, sem ouros nem medalhas, mas com simples e simbólicas coroas de oliveira, como prémio.

Ora o profissionalismo trouxe consigo o exagero competitivo, de forma que, muitas vezes, os atletas atingem o limite do esforço físico pagando com o sofrimento e a falta de saúde a curto prazo. Geralmente, estes desportistas de alta competição atingem o máximo esplendor físico pelos trinta anos, ou menos ainda, e a sua longevidade é curta.

Também a propaganda, o poder político, o poder económico e os media completam o quadro negativo desse desporto de alta competição. Mas é impossível voltar atrás.

Que virá a seguir? Será que um dia chegaremos ao cúmulo de tratar os atletas como os gladiadores ou animais de circo a abater, por entre vivas da assistência aos vencedores, tal como nas arenas romanas?

Mas a glória destes também é efémera e só dura enquanto demonstrarem poder físico para repetir as proezas, entrando no esquecimento rápido, ao menor falhanço.

Tudo isto me veio à lembrança, à terceira vez que vi, em retrospectiva, num curto espaço de tempo, a cerimónia da inauguração das Olimpíadas de Pequim, já entrecortada pelas competições, as entrevistas, as alegrias e alguns choros de atletas, os vivas e os impropérios da assistência...

E jurei para mim mesmo parar um pouco, para poder apreciar melhor, calmamente, mais tarde para não abandalhar, essa primeira visão fantástica da abertura destes jogos de Pequim que me deixou encantado.

Foi um espectáculo único, digno de ver-se por muitos, muitos anos! Não há necessidade de transformá-lo num espectáculo corriqueiro e banal...

terça-feira, 12 de agosto de 2008

OLIMPÍADAS EM PEQUIM

Euforias e desânimos, em Lisboa

As Olimpíadas foram inauguradas, espectacularmente, em Pequim, após as costumadas querelas originadas por moralistas, economistas, políticos, comentaristas, e ainda os oportunistas de serviço. Nestas pequenas olimpíadas prévias da patacoada palavrosa a metro, só os desportistas se mostraram mais tranquilos e apenas preocupados com os seus treinos para obter metas.

Mas não há que admirar nada disto.

Nas Olimpíadas da Antiguidade Clássica entre as Cidades-Estados da Grécia Antiga, desde o século VII A.C., os interesses socio-económicos e as fortes desavenças políticas entre elas foram ultrapassados, momentaneamente, pelas tradicionais e saudáveis competições desportivas com pendor religioso em honra de Zeus. O louvor sob a forma da coroa de oliveira (ou louro) era dado aos heróis dos jogos deixando de lado, entretanto, a inveja, a cobiça, o ouro das vitórias bélicas e as mortes nos campos de batalha.

Esta lição de fraternidade, conseguida com esforço e auto domínio das gentes, foi tomada como exemplo e preconizada a sua aplicação, de forma educativa, pelo Barão de Cubertain. Mas o espírito desta primeira Olimpíada da Era Moderna, em 1896, milagrosa e esforçadamente conseguida pelo idealismo de uns quantos, com o barão à cabeça, nem sempre foi bem compreendido. Algumas vezes as olimpíadas foram até perfeita, oportunista e politicamente aproveitadas para fins pouco recomendáveis que nada tinham a ver com o espírito inicial e os seus verdadeiros objectivos. E foram até interrompidas por guerras, palco de atentados terroristas, guerrilhas políticas várias, etc...

Apesar desses frequentes atropelos, as Olimpíadas da Era Moderna lá se foram cumprindo, cada vez com mais atletas, cada vez com mais nações envolvidas, cada vez com mais brilho, cada vez com maior projecção no nosso mundo visto à escala global, bem longe da pequenez das antigas cidades gregas de setecentos A.C...

Também os portugueses se foram cada vez mais interessando pelas olimpíadas, sobretudo admirando, boquiabertos, as competições e as colecções de medalhas obtidas pelos desportistas cada vez mais profissionalizados das grandes potências e aspirando um dia vir a conquistar algumas, o que aconteceu com a inesquecível, pequenina e voluntariosa Rosa Mota e o humilde, persistente e corajoso Carlos Lopes. Mais uns poucos conseguiram, depois, os grandes feitos de trazerem medalhas, foram vitoriados embrulhados na bandeira nacional e orgulhosamente aplaudidos pelas gentes ávidas de algum pequeno sucesso, depois de muitas décadas de aparvalhamento desportivo, e não só...

Daqui para diante, como é hábito entre os portugueses, viria a euforia, um aumentar constante de esperanças desmedidas, às quais seguiria logo o desânimo, o desespero acompanhado da crítica absurda e desbragada aos desportistas de que se esperavam já grandes feitos e não haviam conseguido mais que meras menções honrosas, ou a eliminação pura e simples.

Ser bom desportista, bom cientista, bom médico, professor, ou cavador de enxada, em Portugal, é embarcar num mundo de contradições, num mar de vagas alterosas e tormentosas, navegando na crista da onda, algumas vezes, e na profundeza dos infernos, a maioria delas...

Classificar alguém de bestial ou besta é apenas uma questão de tempo, sempre muito curto, para as nossas boas gentes, há séculos habituadas a entronizarem como deuses os seus heróis de ontem, ou queimarem-nos, se falharem, no dia seguinte, na fogueira, transformados em bruxos ou demónios.

Desta vez, nestas Olimpíadas de Pequim tão ansiadas e tão bem preparadas, já cantavam de poleiro, contavam ter no papo não sei quantas medalhas e, pouco a pouco, os crucificados do costume foram-se sucedendo, como forma de escape de uma frustração nacional repetidamente assumida, de que os desportistas olímpicos portugueses não têm qualquer culpa:

-Não têm qualquer culpa?

-Gastaram durante quatro anos o nosso dinheirinho. Ganharam balúrdios, foram passear a Pequim e não fizeram nenhum!!! É uma vergonha! Não prestam! Vão trabalhar!

E assim, exercitando a má língua e rogando pragas, incapazes de melhores feitos, os portugueses lá vão passando o tempo, agarrados às telenovelas e às transmissões desportivas da TV, mirando com espanto e inveja aqueles estrangeiros que sabem ganhar medalhas e são mesmo umas máquinas, umas autênticas maravilhosas máquinas humanas.

Entrevistados, alguns dos nossos atletas olímpicos, coitados, sentem-se até envergonhados, culpados da sua impotência ou azar, sem qualquer razão para isso, por não conseguirem aquilo que já eram favas contadas para a malta! Outros respondem aos interlocutores sedentos de sangue, com o orgulho do dever cumprido e mandam os entrevistadores maldosos às ortigas. E um terceiro grupo de desportistas alija responsabilidades, como se estivesse no julgamento de um caso de morte:

-Não podiamos ter feito melhor! Os outros têm mais meios que nós. Não nos foram dadas condições...

Tudo previsível, aliás, e trivial até demais, com as gentes portuguesas, quer em Pequim, quer em Lisboa.

Além disso, vai jogar-se a Super Taça, dentro de dias e pouco depois começa o Campeonato Nacional de Futebol, inundado de jogadores brasileiros, argentinos e africanos, para contentamento geral do pagode.

Por enquanto ainda não se vêem por aí jogadores asiáticos.

Mas os chineses vão abrindo cada vez mais lojas e dando cabo de muito do nosso rotineiro, envelhecido e pobre comércio local.

Fico por aqui.

sábado, 9 de agosto de 2008

SITUAÇÕES CARICATAS, SEM GRAÇA NENHUMA

O multibanco nos tribunais

Até aqui, os tribunais serviam para julgamentos.

Agora, parece que estão na moda os assaltos ao multibanco, nos tribunais!

E porque não, se as caixas multibanco dos tribunais são como as outras, com dinheiro armazenado e pronto para dar aos clientes, quando necessitam, sem horários de funcionamento, dispensando trazer na carteira um monte de notas ou a obrigação de dirigir-se ao banco mais próximo...

Provavelmente, colocadas nos tribunais, dão jeito ao cidadão apanhado desprevenido por qualquer exigência momentânea do poder judicial. O mal é que aos ladrões dão ainda muito mais jeito! Isto, claro, não seria uma caricatura, se a instalação das caixas e a sua segurança tivessem sido bem pensadas...

Os larápios sabem, perfeitamente, melhor que ninguém, que os tribunais não têm segurança, além de muitas outras coisas que não lhes suscitam reparo. Não têm porteiro, nem polícia nocturno, nem guarda privada, nem sistema de alarme, isso lhes basta. È muito mais fácil, estamos a ver, o roubo de um Multibanco colocado no interior de um tribunal, que numa rua. Os tribunais são uma caricatura de segurança!

E por quê, exigir segurança no edifício onde funciona um tribunal, fora das horas de expediente, quando nas horas de serviço tantas vezes não existe? Por quê, quando os juízes são agredidos em plena audiência, por falta de vigilância adequada? Por quê se os papéis, os documentos, os arquivos do seu interior não suscitaram ainda a apetência de um qualquer ladrão especializado? São outros aspectos caricaturais dos pomposos Palácios de Justiça portugueses. Será só fachada?

Mas há mais caricaturas. Por que motivo se há-de culpabilizar os tribunais pela falta de vigilância às caixas multibanco, se estas são propriedade dos respectivos bancos? Porque são os tribunais que as solicitam ou autorizam a instalação nos seus edifícios?

Caricaturalmente, sujeitam-se assim, aos prejuízos de portas arrombadas, de fechaduras viciadas, de vidros partidos, de paredes, pisos e móveis danificados, não falando dos aborrecimentos que isso causa ao regular funcionamento das instituições. Provavelmente a caixa multibanco poderia até ter sido instalada no exterior do edifício...

E não é já de si uma caricatura, qualquer assalto a um Palácio de Justiça?

Onde é que já se viu uma coisa destas, serem assaltadas as instalações onde se ocupa, tantas vezes o tempo, entre outras coisas, a remeter os ladrões para a prisão? Por ventura alguns serão deixados solta...

A verdade é que situações como estas, não tendo directamente nada a ver com a justiça aplicada, não ajudam nada a mudar a onda de descrença da população em relação a ela. E era bom que as imagens passadas ao exterior fossem mais agradáveis.

Finalmente, de quem é a culpa? Suponhamos, caricaturalmente falando, que é dos bancos e do dinheiro posto à disposição dos clientes, nos multibancos. Infelizmente, os ladrões começam a ser já clientes habituais das caixas instaladas nos Palácios de Justiça.

Longe vão os tempos em que os larápios olhavam para os tribunais como boi para palácio...

domingo, 3 de agosto de 2008

DEFESA PATRIOTEIRA DA CONSTITUIÇÃO

Não passou pela cabeça de ninguém...

O discurso do Presidente à Nação, feito há dias, precedido de um costumado tabu que fez época, mas de que muito boa gente já não se lembrava, veio colocar em evidência, mais uma vez, o raciocínio estreito de certos políticos, embalados numa onda de responsabilidades egocêntricas «infalíveis» que não permite a visão ecuménica das situações que enfrentam.

Agora ficou também demonstrado que um certo radicalismo saloio e o puro marketing político se sobrepuseram, ao simples bom senso!

Ora os cidadãos merecem que se pense neles, mais a sério. As brincadeiras político partidárias não são, neste momento difícil, admissíveis, mesmo mascaradas com a defesa «patrioteira» da Constituição, isto é, dos poderes presidenciais imaginariamente em perigo...

Não passou pela cabeça de ninguém que o Presidente publicitasse solenemente e com fins deliberadamente mantidos secretos, a data e a hora de um comunicado à Nação, numa época de férias!!!

Não passou igualmente pela cabeça de ninguém que o Presidente não tivesse um motivo grave e imperioso para apresentar à Nação nessas condições!!!

Nem passou finalmente pela cabeça de ninguém que o Presidente o tivesse feito, para apresentar um motivo de contexto e oportunidade tão discutíveis!!!

A não ser, claro está, pelos políticos avençados do partido a que pertence, apesar de ele ter aprovado, como os outros, o diploma que o presidente pôs agora em causa.

A Constituição é a lei geral do País, deve ser defendida com unhas e dentes por todos os cidadãos e, em especial, pelos órgãos de soberania: o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais, com o Tribunal Constitucional à cabeça. Mas deve igualmente ser por todos preservada de excessos de linguagem, de ser colocada nas bocas do mundo por motivos de falsa política, muito menos badalada em eventuais interpretações ou modificações ao sabor de interesses de turno.

O Tribunal Constitucional lá está para interpretá-la correctamente. A Assembleia da República lá está também para aprová-la ou modificá-la, quando a Nação julgar absolutamente necessário. O Governo lá estará para actuar em sua conformidade. E o Presidente lá deve estar para promulgá-la, vigiar o seu cumprimento e defendê-la, se for preciso.

Mas todos os portugueses cá estão para cumpri-la, sem necessidade de recorrer a conjecturas ou a tabus de última hora...


sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A ERA DOS TRANPLANTES

Aos pares, no futebol!

Desde a descoberta da transplantação de vegetais, nos primórdios da Humanidade e, mais tarde, da enxertia nas plantas, que o homem sonhou, certamente, fazer o mesmo em animais, ou no seu semelhante. Tantos milhares de anos passados e tantas experiências falhadas até à concretização desse anseio, levaram instintivamente à utilização da palavra transplante para a mudança de órgãos ou partes deles, na espécie humana, talvez resultado de uma simples associação de ideias...

Curiosamente, a enxertia nas plantas há muito tem que ver com a melhoria das espécies e a criação ou o apuramento de raças. E na espécie humana?

Já mais que uma vez me referi, nas minhas crónicas e comentários, à generalização das transplantações por dá cá aquela palha, e também a certo tipo de transplantes mais difíceis e até mais paradigmáticos, o mais célebre dos quais foi, sem dúvida, o do coração de um dador num receptor com a vida a prazo. Ficou, dessa vez, provado em definitivo que esse órgão não passava de um motor de material orgânico de alta resistência e não tinha nada que ver com a sede das emoções, função que lhe era atribuída desde o início da Humanidade.

Verdade que o coração, bem protegido e escondido mesmo no interior do corpo, se prestava, desse modo, a todas as suposições, parecendo mais um órgão mágico que um aparelho mecânico. Depois, a corroborar a descoberta, foram usados com frequência e cada vez mais aperfeiçoados e eficientes, os motores metálicos ou plásticos, simplesmente eléctricos, a pilhas, e desprovidos de quaisquer sentimentos...

Há pouco tempo, os franceses conseguiram fazer o transplante da cara de uma moça acidentada que tinha ficado com a sua meia desfeita pela mordedura dum desses cachorros malvados que andam por aí à solta. Nem faço ideia da sensação que deve ter tido, ao ver-se ao espelho, com uma cara nova!

E já há muito foi idealizado o transplante de cabeças...e talvez até tentado em animais, a acreditar em notícias veiculadas por certa imprensa sensacionalista ou de cariz intencionalmente político. Sempre gostaria de ver se a inteligência, a memória e a vontade mudariam conforme a cabeça a funcionar, pois haveria então muitas cabeças a mudar, por aí...Para bem? Para mal? Imaginemos os problemas decorrentes e as discussões eternas acirradas, radicalizadas de legistas, filósofos, responsáveis políticos e religiosos, no mundo inteiro!

De transplantes da pele, de cabelos, de ossos, de rins, de fígados, narizes, orelhas, mãos, braços, pernas e dedos, nem vale a pena falar, de tão banalizados que se tornaram.

Mas a notícia de hoje, proveniente da Alemanha, refere-se ao transplante simultâneo de dois braços completos de um dador acidentado, a um homem de 54 anos, vítima ele próprio, dois anos atrás, de um acidente brutal.

Apesar de ter sido previamente alertado pela equipa médica para o facto de mais tarde vir a ser confrontado com umas mãos que não eram a suas, o certo é que o fulano, acordado da operação, olhou para elas e disse apenas:

-Muito bom!

Portanto, a partir daqui, a cirurgia aos pares, que já é uma realidade, correrá, imagino, célere para a vulgarização, a prazo. Tal o faz supor a velocidade do avanço da ciência e das técnicas implementadas.

Deus nos livre a todos destes acidentes e respectivas habilidades cirúrgicas, por mais bem sucedidas que sejam. E no entanto, há que agradecer a estas equipas de médicos, enfermeiros, cirurgiões, biólogos, farmacêuticos, engenheiros, técnicos de toda a ordem que colaboram em cada nova descoberta ou novo avanço.

Com um pouco de alegria, de ironia ou sadismo que sempre acompanha cada vitória, até apetece dizer que, a partir de hoje, aos pares, é mais barato!

Não resisto a transcrever o comentário jocoso feito à notícia por um provável adepto descontente com a sua equipa de futebol:

«- Estou boquiaberto! Há jogadores do Benfica que vão aproveitar este progresso para transplantar as duas pernas.»

O Benfica que me perdoe.