sexta-feira, 17 de outubro de 2008

TRIBUNAL, PRISÃO E HOSPITAL

Insensibilidade chocante

Há vidas com comportamentos difíceis de explicar. Infelizmente, não são raras. Claro que poderemos sempre dar a nossa explicação mais ou menos rebuscada, mais ou menos simplista, mas nunca saberemos encontrar a verdadeira explicação para o que acontece.

Hoje, logo de manhã, um sujeito de cerca de quarenta anos, tendo sido notificado na véspera, pelo Tribunal da Covilhã, de que lhe era retirada a guarda dos filhos, sentou-se na cadeira do magistrado, sacou de uma pistola, apontou-a à cabeça e ameaçou matar-se ali mesmo, sem dar explicações, não permitindo, desta forma, que alguém pudesse desarmá-lo sem consequências graves.

Três horas depois, os negociadores da Unidade Especial da Polícia conseguiram dissuadi-lo do intento, persuadi-lo a entregar a arma, de que não possuía licença, e respectivas munições, levando-o, em primeira instância, para o departamento de psiquiatria do hospital local, por determinação do Ministério Público do Tribunal Judicial da Covilhã. Será depois do veredicto médico, presente ao Tribunal, pelo ocorrido, etc.

Até aqui, os acontecimentos.

Mas o caso não parece tão simples. Trata-se de um cadastrado com anos de cadeia cumprida por homicídio, com processo de regulação de poder paternal em curso. A notificação da perda desse poder em benefício da mulher, deve simplesmente tê-lo feito entrar em desespero. Após ter-se sentido completamente rejeitado por ela, ficara agora sem possibilidade de refazer uma vida «normal» com os filhos, talvez a única fonte de transferência de afectos que lhe restava na vida, depois de sair da prisão...

O trágico é que, quase com toda a certeza, a decisão do Tribunal foi correcta. O mais certo é que o homem não tivesse mesmo condições para aguentar a carga de manutenção e da educação das crianças, no seu mundo problemático.

No entanto, é sempre fácil dizer a um ex-cadastrado que deve fazer isto ou aquilo, quer goste ou não. Igualmente, depois de um acto como este, dizer-lhe igualmente que aqueles não eram os termos próprios de agir. Por último, ainda será fácil condená-lo a uma pena qualquer de prisão adicional.... que as populações não estão na disposição de aguentar a presença e os problemas de cadastrados e psicopatas.

Pensando apenas no cadastrado como homem, teremos que concordar que, com este antecedente e nestas circunstâncias, muito mais difícil será ele aguentar a nova carga que lhe é imposta e manter-se, por artes mágicas, psicologicamente firme, íntegro, moralmente regenerado e cumpridor fiel da pena.

Por outro lado, a insensibilidade das populações, na apreciação de casos como este é, na maior parte das vezes, chocante. O homem é culpado, está tudo dito! Cumpra a sentença de cara alegre ou triste, que bem a merece! Gente dessa deve ser afastada do convívio das pessoas normais, para sempre! Foi agora apanhado com posse ilegal de armas, castigue-se com agravante! O comentário mais chocante que li, dizia mais ou menos isto: que pena ele não ter ameaçado matar-se e cumprido, já na morgue, pois poupava tempo e dinheiro aos nossos bolsos!!!

Impressiona. Recentemente, a partir de reacções como estas, o governo de uma nação próspera, exemplo de civismo, cultura e bem estar para o mundo inteiro, decidiu eliminar todos os criminosos psicopatas em campos de concentração que afinal eram de morte, concretizando um dos maiores crimes de todos os tempos contra a Humanidade.

Por incrível que pareça, só um comentário, dos que li na Internet, se referia à necessidade de tratá-lo, se fosse vítima de algum distúrbio mental.

Não sei como resolver correctamente um problema como este, mas ocorre-me perguntar, será este o Portugal que nos transmitiram os nossos avós, pioneiro na abolição da pena de morte? Em que País estamos, afinal?

E, no entanto, se atentarmos no tratamento que os americanos dão aos prisioneiros de Guantanamo...

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