terça-feira, 7 de outubro de 2008

MAGISTRADOS, POLÍCIAS E BANDIDOS


Quem paga as favas

A «guerra» das prisões preventivas está atingir os limites da caricatura. Na peugada de uma interpretação formalista do código penal e por vezes sem a mínima ponta de bom senso, a prisão preventiva para alguns cadastrados apanhados em flagrante, ao fim de largo trabalho da polícia, está a ser posta de lado pelos magistrados do Ministério Público. É a «vingança do chinês» pelo desacordo com o legislador, quanto à modificação do anterior regime legal, à sombra do qual ela se aplicava com incrível irracionalidade e exagero, embora agindo com o mesmo formalismo de agora.

Uma notícia de hoje dá conta de que «uma procuradora liberta três cadastrados, os três cadastrados de um gang considerado perigoso. Foram detidos na segunda-feira por posse de um arsenal de armas proibidas, por suspeitas de carjacking e de um assalto a uma ourivesaria. Mesmo assim, a procuradora do Ministério Público de Sintra ordenou que fossem libertados com a medida de coacção mais leve, isto é, termo de identidade e residência.»

Achou a senhora procuradora, seguramente, que as armas eram de brinquedo, que a fuga de casa dos cadastrados seria uma miragem, que o seu arrependimento e sua regeneração imediata os impediria de cometer mais delitos entretanto, ou mesmo de ocultar outras eventuais provas incriminatórias, etc.

«Foram três meses de trabalho da Esquadra de Investigação Criminal da PSP de Sintra deitados à rua, porque nem as armas que estavam em sua posse foram suficientes para a prisão dos três homens detidos pela PSP de Sintra.»

Os suspeitos foram capturados na manhã de segunda-feira e postos em liberdade ainda dentro do mesmo dia.» Tremenda brandura, eficiência e rapidez de julgamento, para tão demorada e persistente investigação!

«Os elementos da PSP sentem-se revoltados e frustrados com esta situação...»

Creio que todos os cidadãos bem formados e no pleno uso dos seus direitos, também.

Eles não percebem nada de leis, é certo, mas têm um sexto sentido, um bom senso tradicional que lhes permite julgar, interpretar correctamente o sentido das leis mais rebuscadas, coisa que o formalismo dos senhores juízes nem sempre lhes permite fazer.

A população da zona, ao saber desta notícia e sem compreender a razão da sentença, fará mentalmente, à senhora procuradora, muitas perguntas concretas, mas todas se resumindo a uma só.

Por quê?:

Também a mesma população da zona, que não percebe nada de leis, como eu, adivinhará de antemão as respostas que irão ser dadas, que se resumem a duas, apenas.

Primeira: os magistrados limitam-se a cumprir rigorosamente as leis, no interesse dos cidadãos.

Segunda: as leis são feitas pelos legisladores eleitos, a quem caberá, segundo eles, a culpa pelo seu sucesso ou insucesso.

Não são, portanto, para aqui chamados, nem o bom senso, nem o espírito das leis, nem o que o povo possa pensar ou não.

E aqui está como a população em geral serve muitas vezes de ping-pong entre uma Jurisprudência umas vezes justiceira, outras justificativa, mas sempre formalista, e uma Assembleia da República que não consegue, por seu lado, transmitir aos Tribunais o verdadeiro sentido das leis votadas, algumas delas até por unanimidade.

É provável que a virtude esteja no meio, com já diziam os romanos.

Isto porque, nem as leis são, nem podem ser equações matemáticas, nem os magistrados deveriam estudá-las e aplicá-las só em função do seu número de vírgulas.

Está à vista quem paga as favas.

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