terça-feira, 22 de janeiro de 2008

NO MEU PAÍS DE BRANDOS COSTUMES


Crónica da república do faz de conta

Infelizmente os problemas que afligem os cidadãos do meu País não se reduzem às simplistas e superficiais opiniões da maioria dos senhores comentaristas de serviço na Imprensa. Claro que eles ganham a vida, por vezes, emitindo essas opiniões e por isso os técnicos que se matam a estudar a sério esses problemas e as situações deles decorrentes, correm sempre o risco de serem atropelados e chamados qualquer nome feio por esses senhores, se não correspondem às suas belas ideias feitas. Mas de belas ideias está o mundo bem cheio. De belas obras, bem pouco!

Quando os romanos invadiram a Ibéria e expulsaram os cartagineses, conseguiram uma coisa importante, a romanização dos povos autóctones, deixando-nos como prenda, além de monumentos espectaculares e outros benefícios, a sua ímpar cultura jurídico-administrativa. A Idade Média não conseguiu apagar essa cultura que saiu vencedora, após mil anos, e foi a base de toda a arquitectura jurídica dos países ocidentais da Europa, fazendo juz ao aforismo romano DURA LEX, SED LEX, seguido à risca por todos menos por um…Portugal!

Este meu País de Brandos Costumes que foi submetido pelas legiões romanas de César, entre outros, sem esforço de maior, tornou-se uma nação sabedora, feita de experiência, habituada a dar a volta às grandes dificuldades com jeito e artimanha, ultrapassando assim a violência e a força dos vizinhos poderosos.

Mas não há bela sem senão. O carácter da gente nacional foi-se fazendo à imagem dessa necessidade, vencendo pela astúcia tudo e todos, e a última vítima, depois da derrota do Feudalismo Medieval, da Inquisição e da Tirania Monárquica Iluminada, foi a própria Lei Democrática.

No meu País de Brandos Costumes é dificílimo fazer leis simples, pela discussão eterna que suscitam, e fazem-se leis incrivelmente complexas com uma facilidade espantosa, porque pouca gente ou ninguém as discute. O pior vem quando essas leis, quaisquer que sejam, chegam ao grande público. E então, a discussão começa sempre com uma violência inaudita, que as torna de muito difícil aplicação.

Ao contrário dos restantes países europeus, o cumprimento das leis aprovadas pela Assembleia da República, o órgão legitimo para fazê-lo, é sempre questionado pelos cidadãos, na busca sistemática de torneá-la e à própria autoridade, à própria Justiça, se possível.

O curioso - e trágico! - é que são muitas vezes as classes mais cultas a manter, apoiar e até incentivar esta maneira de actuar da restante população quando ela acata as leis, aparentemente sem grandes oposições….

Assim, olhando de fora, de longe e sem interesses económicos ou partidários, toda a panóplia de artigos comentados na Comunicação Social, depressa nos apercebemos do tom anti-lei que prospera na Imprensa, criando-se uma ideia muito pouco abonatória para ela. Mas que outra coisa seria de esperar, se os comentaristas fazem parte do povo português?

E assim, meu País dos Brandos Costumes, onde a permissividade às leis é, pois, um lugar comum, assisto, com razão e infelizmente, ao espectáculo de uma Imprensa, que se faz mentora da Sociedade, comportar-se como defensora dessa mesma permissividade.

Agora, o prato do dia na Comunicação Social são os excessos da ASAE, da mesma forma que há algum tempo atrás eram os excessos da Polícia, o autismo e a prepotência excessiva do Fisco, a insensibilidade estúpida do Ministro da Saúde, a violência parva da Ministra da Educação para com os professores, a tirania das autarquias e do Governo ditatorial que atenta contra as liberdades individuais com radares, os videos de protecção dos cidaddãos, ou pelo simples motivo de querer fazer cumprir a lei implacavelmente na Imprensa, na Saúde, no Trabalho, na Educação, na Justiça, no Desporto, nas Obras Públicas, na Economia e Finanças, na Administração Pública, etc.

Deste modo, no meu País de Brandos Costumes, as novas leis são sempre torpes. Há que rebuscar todas as vírgulas, por ao sol as todas as dificuldades da sua aplicação, evidenciar todas as possibilidades de fintá-las e, se isso não chega, por a tónica na violência e desumanidade das autoridades que zelam pela sua aplicação: a polícia, os fiscais da ASAE, os funcionários do fisco, os administradores dos hospitais, os respectivos ministros e o chefe de Governo, se ainda não basta. Todos os meios são válidos. Invocam-se todos os deuses.

No meu País de Brandos Costumes, por outros também chamado de País do Faz de Conta, o objectivo final de muita gente é um só: tornear as leis. em benefício próprio, o que será tomado como esperteza e elogio digno de nota; cumpri-las é pura tontaria…ou beatice, mesmo nas coisas mais comezinhas. E assim, o aumento da produtividade nacional é uma miragem.

Como deve ser bom, para esses fazedores de opinião encartados, fumar um cigarrinho à socapa, num local onde é proibido, e atirar a beata para o chão, só para chatear. Ou ir à caça para uma zona proibida, à revelia da GNR. Ou tomar uma bica numa chávena mal lavada, numa tasca perdoada pela ASAE, por uma questão humanitária…

Para o diabo a lei, os fiscais, o director da ASAE, o Sócrates ou qualquer outro, a CE…

Viva a república dos finórios do costume!

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