segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

A LISTA INTERMINÁVEL


Crónica de domingo passado…

Num dia agradável, como este domingo passado, resolvi, depois do almoço, dar um passeio até à beira-mar, aspirar o ar salgado e apreciar as gaivotas nos seus voos imprevisíveis e graciosos, rasando a praia. Foi o que fiz, e não estou arrependido. O mar estava tranquilo, uma brisa ligeira quebrava, de vez em quando, a monotonia, mas não dava para perturbar a calma que inundava as pessoas e o ambiente. Por isso, abri a porta do carro virada para o sol e sentei-me no banco do condutor, olhando ao longe, sem objectivo, gozando o sol, o silêncio, o infinito do mar azul…

Alguns minutos depois, lembrei-me de que tinha trazido comigo, para uma eventualidade, o último livro do J.R.S. e pus-me a ler, meio a sério, meio distraído, até me fartar. Não vi as horas e não dei conta da passagem do tempo.

A certa altura comecei a sentir frio. A verdade é que o sol já estava bastante baixo no horizonte, e decidi-me a regressar a casa, prudentemente.

Fora um domingo bem passado, para uma pessoa da minha idade.

Hoje, segunda-feira, logo de manhã, que os velhos acordam cedo, comecei a ver as notícias na net, um dos meus desportos matinais favoritos, e foi então que descobri, a seguir à largas páginas de fofoca e comentários ao jogo forte de futebol do fim-de-semana, e da politiquice costumeira, o comunicado aterrador da GNR.

Não se tratava de qualquer referência a uma sexta-feira 13, mas simplesmente ao domingo, ao meu domingo de sol e leitura, ao 27 de Janeiro de 2008, no qual houve 3 mortos na estrada, em 199 acidentes de viação, de que resultaram ainda 82 feridos, 10 dos quais em estado grave, segundo o comunicado.

Lista interminável!

Fiquei triste e indeciso entre parar aqui ou continuar a ler até ao fim o rol das misérias. A frequência deste tipo de acidentes é tal, que a maioria dos portugueses desvaloriza as notícias que quase diariamente aparecem nos órgãos de Comunicação Social. Mas isso ainda não é o pior.

O mais grave é a falta de civismo de condutores e peões, os sábios a tempo inteiro na arte de condução e de bom comportamento nas vias que são de todos, embora muitos se arroguem a extravagância de se julgarem donos exclusivos delas, sem o mínimo respeito pelos outros que nelas circulam.

Os custos morais, e materiais de tais desmandos são enormes, mas nem mesmo assim os ases do volante ficam sensibilizados para os desastres que garantidamente, pensam eles, só podem acontecer aos outros…o que, todos sabemos, não é verdade. E o mal é que, na maior parte das vezes, paga o justo pelo pecador, sofrendo as piores consequências quem foi apanhado casualmente nos acidentes e não tem culpa nenhuma do sucedido.

Esses artistas culpam sempre, quando algo lhes acontece e o interlocutor tem a razão plena, o mau traçado da via ou a sua má conservação, a pouca ou má sinalização da mesma, a deficiente iluminação do local, a falta de passadeiras ou sua deficiente visibilidade, a chuva repentina, o nevoeiro sem aviso, um cão ou um gato matreiro…E, no entanto, a maioria deles circula em velocidade superior à permitida por lei, ou não respeita os semáforos e outros sinais de trânsito, como a paragem obrigatória nos stop e nos vermelhos, a proibição de ultrapassagem em lugares referenciados e tantas outras regulamentações de todos nós conhecidas, que eles acham estúpidas, no mínimo desajustadas…à sua realidade.

Mas, mais ainda do que pelo número de mortos e de feridos, o comunicado de hoje impressionou-me pelo tipo de contravenções detectadas.

A GNR tinha fiscalizado 1993 condutores, elaborando 911 autos de contra ordenação, dos quais 484 correspondiam a infracções graves e 105 a infracções muito graves. Detectaram 430 condutores em excessos de velocidade e 101 com excesso de álcool dos quais 51 ficaram detidos, alguns deles sem carta de condução e ainda 31 sem cinto de segurança e 13 sem seguro da viatura!

É obra! E tudo isto num domingo de Janeiro com sol primaveril, convidativo a uma boa tarde de lazer com a família ou com pessoas amigas…

Em vez disso, alguns comemoraram com cozido em excesso ou excederam-se na pinga, outros, mesmo sem carta de condução, tomaram de assalto ou por empréstimo uma viatura sem seguro e sem pôr cinto de segurança, carregaram forte no acelerador, passaram a faixa central, e uns quantos mataram alguém ou foram parar eles próprios ao hospital…ou ao cemitério.

Supunha-se que os dias úteis da semana eram os mais problemáticos em relação ao trânsito, mas agora vemos que os fins-de-semana o são muito mais. Dá medo sair de casa ao domingo, para fora do burgo…sobretudo ao fim do mês ou nas pontes de feriado.

Tinha planeado já, com a minha mulher, dar um pequeno passeio a uma bonita e tranquila zona rural, no domingo próximo, mas estou desmoralizado. Estamos na época do Carnaval onde tantos excessos são permitidos e todos os cuidados são poucos. E, como se isso não bastasse, meio mundo anda mascarado…O mais certo é ficar em casa, ao quentinho, a terminar a leitura do livro do JRS ontem começada.

E faço votos para que a Brigada da GNR consiga o seu intento de prevenção e ajuda, nestas patrulhas carnavalescas. Oxalá!

Valia a pena, mesmo estragando a festa a uns quantos irresponsáveis que andam por aí, mascarados de ases do volante.

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