sábado, 5 de janeiro de 2008

DERIVANTES DA ECONOMIA…

As decisões economicistas

Há já muitos anos, trabalhei numa empresa que não tinha dificuldades financeiras e por isso fazia gastos sem o devido controlo em determinados sectores. A certa altura, tendo a gerência em vista um projecto de engrandecimento para o qual eram necessários investimentos de certa dimensão, encarregou o economista de serviço de tirar um coelho da cartola: controlar os gastos correntes aos quais ninguém ligava nenhuma. Não queria propriamente um controlo ao tostão, mas exigia de todas as chefias uma atenção mais cuidada sobre as despesas e a sua correcta justificação.

Surgiram, em pouco tempo, notáveis reduções de custos em sectores nos quais ninguém imaginava excessos. Os gastos com papel, fotocópias, tinteiros, clips, borrachas, esferográficas e outro material de escritório foram reduzidos a metade, sem prejuízo do bom desempenho dos sectores e não obstante alguns protestos da comissão de trabalhadores…O aperto nos gastos foi decorrendo com situações mais ou menos complicadas, umas, outras bem simples e outras até bastante caricatas, como a que se verificou no controlo dos artigos de limpeza geral e de higiene privada, tomados, à partida, como um ataque do patronato aos trabalhadores, levando a uma redução drástica dos detergentes, dos sabonetes, das toalhas, das luvas, do papel higiénico, etc. Neste caso, perante a reclamação permanente de alguns funcionários, a administração da empresa resolveu entregar a higienização a uma organização exterior, a qual começou por montar os conhecidos dispensadores de papel higiénico, de toalhas, de detergente, aparelhos de secagem das mãos, etc., obtendo-se, mesmo assim, uma redução notável de despesas. Com a alteração de funcionamento da cantina passou-se algo semelhante, obtendo-se gastos menores com a contratação de uma empresa exterior o que, à primeira vista, parecia impossível.

No fim do ano, com a aplicação de todas estas medidas economicistas, algumas delas até fortemente contestadas, foi possível dar um prémio melhorado ao pessoal e tudo voltou à normalidade. Até o gerente que chegara a ser considerado e apupado como sovina e outras coisas bem piores, passou a ser tido como uma boa pessoa, etc.

Claro que nem todas as coisas se passam, na vida, com esta simplicidade. A nível governamental, não tanto por mérito próprio, mas por determinação da CE que nos governa na sombra, houve que fazer contenção drástica de despesas, em sectores nos quais ninguém deixara de gastar sem controlo, limitando-se os gestores públicos a pedir mais, no fim do ano, para equilibrar as contas cada vez maiores. Talvez por isso mesmo, os partidos políticos que há pouco ainda clamavam excesso de empregos e da despesa pública, os sindicatos que há pouco também clamavam por maiores aumentos salariais, e os autarcas, peritos em conseguir o aval da árvore das patacas das finanças do governo em seu benefício, todos descobriram uma forma de ataque formidável aos adversários que não podem derrotar ou contrariar de outra maneira, chamando-lhes economicistas!

E aí está como, do economista, que se preocupa com as questões de economia e sociais, nasceu o economicista, que trabalha no económico e se preocupa em obter resultados económicos… passando por cima das mesmas questões sociais, pejorativamente falando.

Hoje, na imprensa diária, decisão política economicista já não é aquela que se destina a fazer economias no erário público, na mira de gerir bem o que é de todos, mas apenas uma formidável arma de arremesso sempre pronta para justificar atitudes individualistas, patrioteiras, interesseiras, corporativas, sindicais, partidárias, etc., conduzindo a mera demagogia, sempre mais fácil a qualquer um do que investigar ou encarar a realidade das coisas, por vezes bem complicada e cruel.

Lembro, a propósito, uma breve nota que em tempos enviei ao Público, a propósito de uma acusação de economicista feita a alguém, já não me lembro quem, por encomenda de interposta pessoa ou agremiação partidária:

Caros senhores:

Alguém acha que lançar impostos, fechar centros de saúde e maternidades, aumentar o custo das consultas, etc. são medidas tomadas por gosto, destinadas, «lixando o pagode», a caçar votos? Alguém acha que o ideal é fugir ao pagamento de impostos e os que não pagam não devem ser condenados? Alguém acha que qualquer governo deve dar tudo aos cidadãos até se endividar sem remédio, não exigir nada em troca e depois não prestar contas a ninguém? Alguém acha que a saúde depende só dos hospitais regionais e não, igualmente, de muitas outras medidas para a melhoria da qualidade de vida das populações?
Felizmente a C.E. obriga os políticos a contas à europeia e não à antiga portuguesa. Isso custa bastante, tanto mais que nós não estávamos habituados a um mínimo de rigor! Mas só depois de uma gerência eficaz dos dinheiros públicos poderão vir, por acréscimo, todas as benesses a que os portugueses têm direito, sem qualquer discussão! Será isto, na realidade, a tal decisão economicista de que tanto falam?

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