segunda-feira, 29 de setembro de 2008

JARDIM-DE-INFÂNCIA

Cenário de violência


Numa cidade tranquila de província, logo de manhã, um polícia, ainda jovem, sacou da pistola e matou uma mulher, num jardim-de-infância. Não foi um caso de eficácia passado em algum desses assaltos que vai havendo por aí, nem a mulher era dessas que as notícias, ou os anúncios, expõem à mórbida curiosidade pública.

Àquela hora, ainda não eram oito e meia, o polícia entrou no edifício, onde a sua mulher era funcionária de limpeza e cumpria normalmente as suas obrigações, acompanhada do filho do casal, de sete anos, e disparou-lhe à queima-roupa.

Para além do acto tresloucado do indivíduo, outras circunstâncias impressionam ainda e deixam pensativos os cidadãos comuns: o sangue frio com que ele foi perpetrado, o facto de o homicida ser um polícia de vinte e nove anos, a presença do filho, a insistência, com certa frequência, no crime passional violento, sobretudo contra mulheres.

Há por aí a ideia de que elas estão cada vez mais a ser as vítimas indefesas da brutalidade, também cada vez mais assanhada, dos maridos ou companheiros e não sei se será mesmo assim. De alguns anos a esta parte, a Justiça tem-se ocupado mais a sério destes casos de violência doméstica. Antigamente ela mesma quase sempre desculpava aos machos, nas épocas em que a mulher era objecto, no mínimo escrava de sua inteira propriedade. Aos poucos, essa mentalidade foi-se modificando paralelamente com a educação e a independência económica dos elementos do sexo fraco mas, mesmo assim, nem sempre a força dos argumentos da mulher é suficiente para contrapor aos argumentos da força bruta masculina e a certos preconceitos que ainda perduram. Provavelmente, haverá hoje menos casos de violência doméstica que antigamente mas, em contraposição, são mais noticiados e expostos. Será assim? E, mesmo assim, são muitos.

Seja como for, geralmente, os filhos dos casais, quando não são vítimas directas, fisicamente, acabam sendo vítimas económica, moral, psicologicamente para uma vida inteira. Como poderão esquecer e livrar-se do pesadelo? Os restantes familiares ficarão igualmente marcados pela recordação e os seus trágicos efeitos.

Impressiona também, neste caso, o facto de o agressor ser um jovem, polícia de profissão, e usar, para cometer o crime, a sua arma, embora seja frequente a utilização, pelos homicidas, da sua ferramenta de trabalho, a que está à mão, a mais disponível...

Que terá passado pela cabeça deste psicopata, para tratar tão drasticamente uma situação de recente separação conjugal, ao que parece provocada pelas suas frequentes agressões à consorte? Neste caso, ela não teve sorte nenhuma.

Dá que pensar, igualmente, o facto de tratar-se de um elemento das forças policiais. Ultimamente têm-se registado casos de agressão mortal por agentes da Polícia e da GNR, e até alguns suicídios, situações que vão minando a confiança do cidadão comum nos elementos da sociedade encarregados de ajudá-los, protegê-los e defendê-los.

É humano, dirão alguns. Certo. Que haverá, nesta insondável alma que nos anima, que não seja? E contudo, às vezes, o género humano consegue portar-se pior que muitos animais.

O jardim-de-infância foi encerrado por alguns dias, devido ao estado de choque que se estabeleceu entre os funcionários. Era cedo, as carrinhas que iriam trazer as crianças estavam de partida, quando se deu a ocorrência. Simples coincidência, ou premeditação do homicida? Já pouco importa.

O certo é que não estava previsto que jardins-de-infância viessem a ser cenários de acontecimentos impróprios para adultos, quanto mais para crianças...

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