segunda-feira, 23 de março de 2009

ATÉ QUANDO, CATILINA?


Provedor ou promotor de desavenças

Já vai em cerca de nove meses a desavença entre os dois principais partidos sobre a escolha do novo Provedor de Justiça.
Segundo reza a Constituição da República, esta alta entidade pública deve ser aprovada por uma maioria de dois terços dos deputados eleitos. Estabeleceu-se, por isso, um consenso segundo o qual seriam os dois maiores partidos a escolher o provedor, visto que, pelo número de deputados envolvidos, não seria viável a confirmação legal do nome proposto, sem os votos de qualquer deles.
O consenso partidário tem funcionado razoavelmente. Mas agora não se verifica, com o extremar de posições do maior partido da oposição, para quem o cargo de provedor representa uma arma caída do céu, das poucas que o maior partido no poder lhe permite usar, pela desproporção de deputados eleitos. O caso tem-se revelado difícil de resolver.
A situação de impasse continua, depois de nove meses de teimas e acusações mútuas, algumas das quais são, no mínimo, ridículas e incompreensíveis para a maioria da população.
É interessante ler as notícias da imprensa e os comentários, quase sempre alinhados por um ou outro dos contendores, escasseando uma visão independente e séria da questão. Por mim, estou farto destas discussões ou comentários politiqueiros que já passaram para os comunicados diários com acusações ou justificações para eleitor ver, pedidos de intervenção aos Presidentes da República e da Assembleia da República, apelos aos partidos responsáveis pela escolha, e até uma infeliz frase de cariz partidário do actual provedor, pessoa isenta durante todo o seu mandato, considerada por todos, mas farto já da longa espera pelo sucessor.
A pouco e pouco, ante a demora na resolução do problema, foram surgindo na Comunicação Social, filtrados conveniente e manhosamente pelos interesses partidários, os diversos nomes apresentados de cada lado, e alguns aspectos de um suposto pacto de regime para a escolha, que a outra parte contesta, de que o provedor pertenceria a uma personalidade conotada com o maior partido da oposição.
Resolvi fazer uma pesquisa pessoal a este respeito e pude verificar, preto no branco que, muito simplesmente, desde 1990, isto é, durante 19 anos sem excepção, todos os provedores de justiça foram escolhidos entre membros ou simpatizantes do PSD, num período em que os governos foram repartidos por ambos os partidos maioritários.
Ora estas e outras significam que muitos dos argumentos apresentados são altamente falaciosos. A questão resume-se apenas, no fim de contas, a obter ou não mais uma cadeira do poder, o que não é desprezável desde este ponto de vista porque, ainda que o provedor seja uma personalidade isenta no exercício das suas funções, tem assento no Conselho da República, onde as cores são favoráveis por um voto ao PSD neste momento, podendo eventualmente passar para a cor rosada, de acordo com a escolha do novo provedor.
O PS resolveu apresentar em público uma proposta à primeira vista irrecusável: o Professor Jorge Miranda, emérito constitucionalista, assumindo um consenso quase nacional, homem da esfera do PSD.
Mas o caricato da questão não se fica por aqui. À última hora, o PSD rejeita este nome, porque foi apresentado pelo seu opositor, e avança com o nome de uma Senhora Professora de Direito, com um novo argumento: é altura de escolher uma mulher para um alto cargo da Nação!
E assim surge de novo o impasse, que se manterá até que saia um coelho da cartola, já que umas tantas bordoadas à antiga, como muito boa gente desejaria, estão fora de questão em democracia...
Como não sou mágico, sugiro apenas que se encontre rápida e previamente um Provedor de Desavenças, porque promotores delas há com fartura. A partir daqui, e por seu intermédio, a escolha do Provedor de Justiça seria fácil...
Mas não estou seguro que isso suceda de facto. Por isso dou uma segunda sugestão aos partidos, esta de resultados garantidos, a de ir escolhendo e rejeitando candidatos, alternadamente, cada vez de mais baixo nível, até chegar a um qualquer pobre diabo que conseguiria o consenso geral, pela força das circunstâncias.
Não sendo assim, que mais poderá acontecer?
Só me ocorrem as palavras de Cícero, no Senado Romano:
«Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência?»

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