Mil maneiras de cozinhar bacalhau
Estou já sem vontade de rever os meus fracos conhecimentos da língua inglesa, depois das incidências da eleição de Obama e do seu slogan, repetido nos EUA até à exaustão. Também por cá os portugueses apanharam-lhe o jeito e não param de multiplicar diariamente as três palavras mágicas, de cada vez que abrem a boca. Como agora, com este frio, não é época de moscas, continua apenas frequente a saída de asneiras.
O aproveitamento oportunista, bem à portuguesa, como sempre, não se fez esperar, como se fosse uma nova edição das mil maneiras de cozinhar bacalhau.
Primeiro, foram escancaradas as parangonas da imprensa, depois as tiradas bloguistas da Internet e a seguir os mails a aproveitar a conjugação do verbo to can, para enviar aos amigos e aos inimigos a frase com a dita conjugação, na pessoa certa, quase sempre acompanhada de desenhos, caricaturas, anedotas e outras ridicularias em que a nossa imaginação é fértil, muito mais que na produção de bens de riqueza, seja para consumo, seja para a famigerada exportação…
Logo depois, foram os políticos, os comentaristas, os populares a agarrar o poderoso verbo para reforçar as suas tiradas, directas ou indirectas, o que mais há por aí.
Mas de que estaria eu à espera?
Como poderia ter esquecido, ainda que por momentos, o velhíssimo ditado popular, sempre actual, referindo acertadamente que, quando mija um português, mijam logo dois ou três? De qualquer forma, nunca havia pensado que ele podia ser posto em evidência tantas vezes, num curto espaço de tempo.
É demais, mesmo tendo em conta a nossa tremenda falta de imaginação…
E na própria Assembleia da República!
Pois ontem, qual cereja em cima do bolo, até Sua excelência o Senhor Presidente da República tirou a célebre frase da candidatura de Obama dos resquícios da sua memória, para adaptá-la aos jovens que esperavam dele algumas palavras de encómio: yess, you can!
Já tinha ouvido a frase e os seus sucedâneos não sei quantas vezes, e esta foi a gota de água. Invadiu-me um tédio avassalador, recostei-me um pouco mais no sofá, fechei os olhos para não ver mais do mesmo e passei pelas brasas, mesmo sem ter tido necessidade de conjugar yess, I can…
Quando regressei ao convívio dos meus netos, verifiquei que ainda estavam entretidos a rabiscar qualquer coisa do que tinham aprendido na última aula de inglês. Um deles atirou-me logo uma pergunta que me reposicionou instantaneamente no ponto onde, por momentos, deixara de ver o ecrã:
-Avô, que queria dizer o Presidente àqueles rapazes, que eu não percebi?
Regressado definitivamente ao mundo em que vivemos, enchi-me da pouca paciência que me resta, expliquei o que sabia e aproveitei para ensinar-lhes a conjugação completa, fazendo uso dos respectivos pronomes pessoais: I, you, he, she, it, they can…
Assim, acerto sempre em todos, sem perigo de esquecer alguém.
Já estou enjoado!
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