terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

CRIATIVIDADE PORTUGUESA


Anedotas de uma certa crise

A crise económica em que estamos a afundar-nos tem o seu lado caricato, paralelo à tristeza que invade tradicionalmente a população portuguesa, esteja ela em crise ou não. As anedotas que, mesmo assim, circulam por aí, são aos molhos e, segundo alguns, serviriam para desmentir que os portugueses são sempre macambúzios. A última, que vi publicada num interessante artigo do D.N., não consegui retê-la só para mim e resolvi transcrevê-la para gáudio daqueles poucos que tiverem coragem de ler estas linhas…se é que não a conhecem ou se divertiram já com ela, ao lerem o jornal. Não cobra direitos de autor.
A velhinha chega à peixaria e pergunta: "Tem jaquinzinhos?" Mal a peixeira disse "Temos sim, minha senhora", ela fez o pedido: "Então corte-me aí duas postinhas do meio!"
Mais difícil é classificar as anedotas que já ouvimos, pela sua graciosidade, a sua intenção e acutilância, etc. Mas seria uma tarefa espectacular e gratificante para quem se entretivesse a fazê-lo.
Também seria interessante catalogar os chistes que captamos todos os dias na TV, nos discursos, nas entrevistas, nas telenovelas, nos noticiários, etc. Pessoalmente não tenho jeito nem paciência para isso e, além do mais, cada vez vejo menos o pequeno ecrã. Pequeno, é como quem diz, que agora já não é assim tão insignificante, desde que os hipermercados de electrodomésticos introduziram a apetência das populações pelos panorâmicos. Difícil é não tomar o facto como uma anedota, nos tempos que correm.
Com crise ou sem crise, já não há por aí bicho careta que não tenha a sua TV digital. Poderá andar macambúzio, chamar nomes ao patrão que não deu aumento, ou ao governo que aumentou os impostos e a idade da reforma, mas não deixará que o vizinho do lado lhe passe à frente, em termos da nova tecnologia. Esta é, para mim a anedota do ano!
Mas há mais. Com as previsões do crescimento da crise que abundam na comunicação social, os hipermercados resolveram desfazer-se dos «monos» ou dos excessos de produtos armazenados, enquanto é tempo, colocando em saldos apetecíveis alguns artigos, pouco acima do seu preço de custo. Um dos mais propagandeados por aí foi o computador portátil, de tal forma que já destronou o computador tradicional do top de vendas. Também eu me entusiasmei a adquirir um portátil de grande capacidade, e com todas os acessórios imagináveis, a preço módico. Aqui, a anedota está em que os vendedores, bem à portuguesa, nem fazem ideia do que estão a vender.
O sistema operativo que a Microsoff aplicou nos aparelhos, a partir de fins de 2007, provoca interrogações e reclamações dos clientes que os encarregados das vendas não estão habilitados a satisfazer. Seria de toda a conveniência que aos funcionários tivessem sido ministrados cursos de formação sobre o W. Vista, para poder responder ou instruir os compradores, mas em Portugal, país do desenrascanço tradicional, é extremamente difícil implementar esse evidente sistema.
Foi assim que, igualmente habituado a ele, e depois de várias reclamações e inquirições aos funcionários de diversas firmas vendedoras do equipamento, tive que desenrascar-me sozinho, se assim o quis. Muitas outras dúvidas ainda aguardam que algum familiar ou eu próprio as resolva com paciência, que o desespero é mau conselheiro.
Outra anedota que corre por aí é o aparecimento da nova máquina de café Nexpresso, genial combinação das cápsulas da Nestlé e do anterior café expresso. As vendas continuam a subir, em Portugal, apesar da crise e do preço!
A última e triste anedota a que vou fazer referência, dentre as milhares possíveis, é a da grande criatividade da nossa gente, para ultrapassar a crise. Um velhinho trôpego, humilde, pobremente vestido, com perto de oitenta anos, adaptou imaginativamente um pequeno carrinho de bebé a carro de mão, arrasta-o pela frente de um ecoponto, onde pesquisa, com uma improvisada cana de pesca, alguns bens de consumo abandonados…
E enquanto olho do alto da minha janela, espantado, meio incrédulo ainda, procurando descortinar a produtividade do velhinho, um amola-tesouras, à antiga, com o equipamento adaptado à roda traseira de uma bicicleta meia podre, chama eventuais fregueses soprando numa flauta feita de cinco pedaços de canas de vários diâmetros, pela rua ladeada de arranha-céus de gente fina, onde os vestígios da crise ainda não chegaram.
E ainda dizem por aí que em Portugal não há criatividade...
O nosso país é uma anedota permanente!

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