Pequena crónica das profecias do Bandarra
Não fora o hábito inveterado que os portugueses cultos têm de fazer sobressair o seu pessimismo sobre as coisas mais importantes da nação, da mesma forma como eles e os restantes nacionais aplicam a má-língua quando se expressam sobre o vizinho do lado, o discurso destes senhores poderia ser tomado com alguma seriedade. Assim, com o derrotismo nacional tradicionalmente instalado de alto a baixo na sociedade portuguesa, propagandeado diariamente pela Comunicação Social como uma fatalidade, mais uma achega como esta pouco ou nada importa já.
Discursos deste tipo fazem parte da idiossincrasia pátria cultivada desde há séculos, neste país pequeno como uma aldeia grande, com as virtudes e defeitos inerentes. A elevação aos píncaros das vitórias insignificantes convive com o afogamento nas profundezas pelas derrotas mais mesquinhas e incríveis, levando sistematicamente ao desânimo sem fim à vista.
No fundo, no fundo, este é o resultado da má-língua institucionalizada, ou melhor, da maledicência ensinada nas escolas, profissionalizada nos empregos, vivida na própria vida familiar e cívica em geral, publicada e propagandeada finalmente, badalada aos quatro ventos por forma a que ninguém fique imune aos seus efeitos.
O resultado é este país de casmurros pessimistas a propósito de tudo e de nada, vestidos de cinzento e negro, com os olhos postos no chão, esperando a cada momento a chegada da sentença de morte, porque nada é bem feito por ninguém, nada se aproveita em parte nenhuma, todos os outros são uma corja de incompetentes, corruptos e criminosos e cada um é sempre vítima de qualquer carrasco ao virar da esquina.
E descobriram então estes Bandarras que a nação estava em perigo de morte!
Claro que, ao longo de séculos, muitos outros já haviam profetizado o mesmo, sem resultado. Bandarra só houve um, era natural de Trancoso onde tem justamente o seu monumento, e a história prova que foi sapateiro de profissão. Não consta que artistas de outras profissões se tenham distinguido nas profecias em Portugal, por mais cultos que sejam os seus membros!
Para grandes males (a toda a hora tão apregoados), lá diz o povo, há grandes remédios. É que, nos tempos de hoje, já ninguém acredita em profecias.
Estarei errado?
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