quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

GOZEMOS O ESPECTÁCULO

Olhemos sem medo, as nossas misérias

Liguei a net e logo me apareceu o site do Correio da Manhã, com os títulos espantosos que a seguir transcrevo:

Uma desbunda grande esta nova vergonha

O velhíssimo trauma lusitano perante a potência italiana acrescentou mais uma vergonha à tradição: desta vez os italianos tiveram o prazer de tirar ...

Corrupção mais vigiada

O PS vai propor a criação, até ao Verão, de uma entidade “com autoridade” para a prevenção da corrupção, recusando a proposta do PSD, reiterada por ...

Disputa democrata está para durar

Sem surpresas, a maratona eleitoral da super terça-feira nos EUA confirmou aquilo que já se sabia: John McCain é o grande favorito à nomeação ...

Inspectores do Fisco temem processos

Os inspectores tributários vão recusar-se a fazer correcções à matéria colectável dos contribuintes com base nos chamados métodos indirectos. Aqueles ...

Hospital entrega doente a família errada

Um homem de 74 anos, residente em Miranda do Corvo, recebeu alta dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) na sexta-feira, mas, devido a uma ...

Polícias só com pistolas de canhotos

PSP e GNR ficaram insatisfeitas com os testes realizados depois de a Glock (fabricante austríaco de armamento) ter entregue a primeira tranche das 50 ...

Ministro segura Alípio

As críticas ao director nacional da Polícia Judiciária já alastraram de todos os sectores da

Ambulâncias com GPS

O INEM – Instituto Nacional de Emergência Médica está a equipar todas as ambulâncias de socorro, incluindo as que se encontram localizadas nos ...

PSP protegia prostitutas

Foi uma chamada telefónica que alertou, às 05h00 de ontem, a PSP do Porto. Um dos seus agentes tinha sido baleado

Não vou criticá-los. Eles são certamente uma opção do corpo redactorial do Jornal e, se não escolhesse estes, dentre milhares possíveis, teria encontrado outros, uns melhores e mais adequados às notícias que encabeçam e outros menos. Também poderia surgerir títulos mais sugestivos, mais apagados, mais fantasiosos, mais aberrantes, eu sei lá.

O que me preocupa não são os títulos em si, mas a selecção das notícias, com a já tradicional propaganda do que é mau, do que é deficiente, do que não deveria ter acontecido, do crime, do desastre, da miséria, da bandalheira, do moral e profissionalmente incorrecto…

Reparemos que, dos nove títulos citados, apenas dois poderão ser tomados pela positiva, o que significa que mais de 77% da informação aqui posta a circular para uso público é basicamente negativa!

E, perante este panorama, não sei já que mais admirar, se a facilidade com que se explora este tipo de notícias, se a avidez com que as gentes as apanham no ar e as engolem com sofreguidão, desprezando as outras, as sérias, as de conteúdo técnico, científico, profissional, artístico, moral…

Há cerca de um mês, enviei um mail a um conceituado jornalista, chamando a sua atenção para os destaques das «más» notícias e a fraca difusão das «boas», insistindo que a Imprensa deveria sobrepor a sua acção formadora à informadora…e, mais ainda à acção tantas vezes desinformadora. Respondeu-me delicadamente que a Imprensa tinha que resolver muitos problemas na escolha dos títulos e das notícias a publicar, mas que, se o público gostasse das «boas» notícias, isso ajudaria muito…

Foi tão diplomata na sua resposta, envolvendo a culpabilidade em tal delicadeza, que consegui acalmar a minha fúria inicial ao ler o seu mail. Cheguei a escrever mais ou menos que, se ele tivesse um filho, de acordo com a sua teoria não deveria ensiná-lo nem castigá-lo, mas fazer-lhe todas as vontades, todos os gostos…nada mais. Assim vender-lhe-ia a sua bela imagem de pai «baril» sempre ao dispor, sempre pronto a perdoar e ainda por cima, a mostrar-lhe, a pedido, tudo o que fosse menos aconselhável…

No ponto em que as coisas estão, não valia a pena responder desta maneira.

Não o fazendo, contudo, encontrei finalmente o caminho da posição cómoda, ridícula de encolher os ombros…perante o espectáculo diário que nos mostra a Imprensa Portuguesa.

Na realidade, qualquer dos títulos referidos poderia proporcionar uma crónica irónica ou um comentário crítico. Tem matéria para muitos dias de trabalho. Pode ser que, noutra ocasião, com mais vagar e melhor disposição, ainda volte aqui. Mas, por hoje, basta!

Ao menos por um dia, enchamo-nos todos de coragem. Olhemos sem medo as nossas misérias.

Gozemos o espectáculo!

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