As guerras, os genocídios, as forcas, as inquisições, os fornos crematórios e outras propagandeadas maravilhas, são exemplos vivos desse radicalismo que ainda hoje sobrevive por aí, meio oculto, mas sempre pronto a actuar, logo que se lhe dê uma oportunidade.
Mas há um certo radicalismo mais subtil, na mente de muito boa gente, que não tem nada a ver com o que acabo de dizer, mas apenas com o desejo de ver ou fazer triunfar a todo o custo os seus pontos de vista, contra todas as regras de um simples bom senso, tapando mesmo, se possível for, a boca a quem ousa ter opiniões diferentes. Com a fatal e ancestral justificação da sua razão, sempre plena, indiscutível.
As boas normas que hoje se tornaram uma quase obsessão, nas condutas e nos procedimentos técnico-ético-legais, mostram, por vezes, algo desse ancestral radicalismo disfarçado.
Também ao ler certos comentários com que a imprensa nos brinda, de vez em quando, ficamos com essa sensação.
Ora isso não tem nada a ver com o elogio da permissividade, da libertinagem, da fuga à lei ou à justiça que alguns apregoam, sob a capa de defesa dos direitos dos cidadãos. Esse é o outro extremo do leque.
A propósito, não quero deixar de referir que, nos últimos tempos, poucos diplomas legais foram tão denegridos como a «famigerada» lei anti tabaco, aplicada na maioria das nações da Europa Comunitária. Como sempre, os portugueses negaram terminantemente a sua colaboração na elaboração da lei, como é hábito, mas os fumadores logo a criticaram vivamente depois de aprovada, alegando a limitação abusiva da sua liberdade individual. Eles que nunca respeitaram a liberdade individual dos não fumadores, em qualquer lugar onde se encontrassem.
Os comentários mais incríveis foram impressos, caricaturando a lei, os fiscais, o governo, alguns até incentivando directa ou sorrateiramente à desobediência...
Aos poucos, as coisas foram acalmando mas, mesmo assim, alguns comentaristas vencidos ainda lançam alguns petardos como vingança, mais um incentivo tardio à confusão.
Não resisto a transcrever umas breves linhas com que um desses senhores, forte opositor à lei antitabaco, termina hoje o seu arrazoado, num periódico de referência, pretendendo mostrar a incongruência da aplicação da lei, nos hotéis:
«Os cidadãos podem fumar tranquilamente no recato dos quartos, ao abrigo dos olhos inquisidores de algum fundamentalista voluntário ou dos terríveis agentes da ASAE e similares. É por isso que nestes locais interditos a viciados não se fuma pouco. As aparências iludem mesmo.»
E, já agora, aqui vai o curto comentário que lhe enviei e foi censurado, como imaginara:
É evidente que cada um, no seu quarto (de casa ou de hotel), pode fazer o que quiser...até fumar! Só faltava aparecer uma lei a proibir a liberdade na alcova!...
Caricaturas.
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