quarta-feira, 9 de julho de 2008

AS LEIS E O SEU CUMPRIMENTO

Crónica de espertezas saloias

O IVA baixou de 21 para 20%, a partir de 1 de Julho de 2008. É pouco, dizem as gentes. Quer isto dizer, contudo, que, em teoria, os preços das mercadorias ao consumidor, deveriam baixar, também, qualquer coisinha. Mas nem sempre é assim!

O negociante português, com aperfeiçoada esperteza saloia, arranjou, como de costume, uma forma habilidosa de ficar mais beneficiado com o diploma. Na maioria dos casos, manteve ou aumentou os preços que deveria baixar!!! E assim, fez o «três em um»: o IVA que pagava ao Estado, baixou efectivamente em percentagem, mas manteve o mesmo valor, pelo que o preço de venda ao público aumentou ligeiramente, não incomodando muito os clientes, e o lucro subiu mais uma pisca...

O ministro da Economia, coitado, lá andou pelos hipermercados, a tentar ver o invisível!

Já devia saber que é assim com grande parte das leis, quando postas em prática. A intenção do legislador é boa, mas rapidamente fica subvertida pelos chico-espertos que abundam no País. Lá diz o Povo que anda meio mundo a enganar o outro meio!...

Comentários, para quê?

Vim passar uns dias à aldeia, onde não há habitantes suficientes para hipermercados locais, mas todos têm carro para lá irem fazer compras. Ao cimo da minha rua, há um pequeno café com o nome de «Faz-te Esperto». Ao princípio achava graça ao nome e tive ganas de perguntar ao dono a sua razão de ser, mas logo me chegou aos ouvidos que essa era a alcunha que as gentes do lugar lhe haviam posto, há muitos anos, eles lá sabiam porquê...

Ou a frase seria antes um conselho aos compinchas da terra que vão ali tomar café, ou refrescar-se com uma cervejinha acompanhada de caracóis?

Talvez. O povo lá diz, quem não fizer parte da Quadrilha do Olho Vivo, está tramado!

Este é o país que temos, onde ser sério, honesto e cumpridor, cada vez é mais difícil e menos compensador. A verdade, porém, é que já a minha avozinha dizia o mesmo, e andava a pé...

Entrei no «Faz-te Esperto» a tomar um café, para espairecer de tristezas. Lá dentro o rádio de serviço apresentava a voz do Paço Bandeira, que iniciava a canção:

-Oh Elvas! Oh Elvas! Badajoz à vista!...

E logo um cliente matreiro, apoiado ao balcão enquanto saboreava uma bica com cheirinho, comentou com o sentido apurado da carestia da vida:

-Deitei-me numa cama curta e dormi com os pés de fora. Isto tudo é uma manta de retalhos!

Do outro lado do balcão, o «Faz-te Esperto» sorria, sem dizer palavra...

Saudei as personagens, tomei rapidamente a minha bica, curtinha com adoçante para enganar o vício e a hipertensão, pus no balcão os cinquenta cêntimos da ordem e regressei a casa ainda mais pensativo do que saíra, procurando a sombra.

Contrariando o meu discurso, o «Faz-te Esperto» não tinha aumentado o preço da bica. Era um herói!

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