quarta-feira, 2 de abril de 2008

PRÓS E CONTRAS

Todos contra todos, ou a deseducação geral

Assisti ao «Prós e Contras» da RTP1, sobre Educação, no qual ouvi de tudo um pouco, mas nada de substancial. A maioria das intervenções teve por objectivo a badalada cena do telemóvel no Carolina Michaelis e, por tabela, a disciplina, a autoridade dos professores, a sua avaliação, o centralismo da administração escolar, as condições de ensino, os problemas laborais, etc., etc., um sem fim de temas, de constatações, de recriminações, de acusações a torto e a direito, mas sem aportar nada de positivo a qualquer desses problemas…os quais toda a gente conhece, de que toda a gente fala, que todo o mundo critica e, finalmente, na altura própria, sacode para o lado que dá mais jeito a água do capote.

Sim, porque a educação não se faz por decreto, nem depende apenas das leis em vigor, ou da sua alteração ou discussão que em Portugal é já uma forma caricata de passar o tempo. A educação depende dos pais, dos professores, da sociedade em geral, do civismo das gentes, muito mais que da acção governativa! E o que se tem visto, ao longo destas últimas dezenas de anos, é a baralhação das leis e das teorias educativas por parte dos sucessivos governos e a bagunça da sua aplicação e do seu cumprimento, por parte dos destinatários.

Já há uns dias eu tinha escrito que o assunto era uma verdadeira guerra de todos contra todos, com os pais a acusarem os filhos, os professores e o governo; os professores a acusarem o governo, os alunos e os pais; os alunos a acusarem os professores, os pais e o governo; e este a acusar os professores e os alunos…Não vale a pena falar dos aproveitamentos politiqueiros circunstanciais.

Mas agora o panorama ainda é mais «divertido», porque o centralismo da questão educativa foi transferido para a autoridade dos «profes», a indisciplina dos «boys» e o uso de telemóveis nas salas de aulas… com intervenções da Direcção Regional de Educação, do Procurador e do Presidente da República!

A que ponto isto chegou!?

Se a intervenção da Direcção Regional de Educação me parece natural, a do Procurador e a do Presidente são de todo desajustadas, não querendo com isto dizer que não devam preocupar-se com as palermices que ocorrem no país. Qualquer dia, alguém dá um «traque», o Procurador intervém e o vizinho do lado pede audiência ao Presidente da República. É a desresponsabilização geral!

Sem desvalorizar a questão suscitada pelo filme executado pelo aluno do Carolina Michaelis, parece-me que, como de costume, a montanha vai parir um rato, apesar dos milhares de páginas já escritas e do rotineiro vozear sem nível sobre o assunto.

Cenas, como esta e outras bem piores, acontecem todos os dias, nos milhares de escolas portuguesas, com centenas de milhares de professores e alguns milhões de alunos. E, bem vistas as coisas, o que choca em tudo isto é a insubordinação cada vez mais notória dos alunos e a incapacidade dos professores para gerir a situação. Nada que não fosse previsível à distância, desde que a família se foi desagregando e os pais, por desleixo ou por dificuldades da vida, se foram demitindo da educação dos filhos.

Restam os professores, no fim da linha!

Mas estes têm-se mostrado incapazes de fazer o duplo trabalho que agora a sociedade espera deles: ensinar e educar. E, se no ensino podemos discordar da sua actuação, neste ou naquele ponto, na educação os professores em geral não têm conseguido substituir os pais, desde a primária até ao ensino universitário. Era difícil e nem estavam preparados. Mas também nada fizeram para isso, nem os dirigentes se ocuparam desse «pormenor», privilegiando o ensino e baldando-se ao problema da educação, tal como os pais. Muitos pensaram mesmo que a tarefa dos professores era apenas ensinar e estavam dispensados de educar…Mas sem educação não há ensino que valha.

É fácil agora deitar a culpa aos telemóveis, à burocracia, ao governo, como no meu tempo se culpavam as fisgas artesanais de arame, os alfinetes metidos à socapa nas cadeiras e a inépcia dos reitores, já que do governo a Pide não deixava falar. Mas, mesmo antigamente, sempre houve professores pouco sábios que pedagogicamente eram uns ases a dominar as situações críticas e outros muito sabedores que eram um autêntico fiasco a manter a disciplina nas aulas.

Porque a verdade é que não se nasce professor competente, por geração espontânea, mas aperfeiçoa-se com esforço consciente, muita e permanente formação científica e pedagógica, bastante profissionalismo. Cada escola tem que ser auto-suficiente na resolução dos seus problemas internos, na formação dos seus mestres, no ensino dos seus alunos, na sua educação, no grau de autoridade democrática a impor, nos seus regulamentos internos, na observância e na aplicação da disciplina, no relacionamento com os pais e o exterior, etc. Deve mesmo caprichar nisso tudo com verdadeiro espírito de missão, e nunca baldar-se aos problemas ou procurar justificações para não actuar…

Na minha óptica, esta será a solução de todos os problemas da nossa educação ou da maior parte deles. Sem recorrer a métodos ditatoriais nem a leis esquisitas que alguns por aí já solicitam.

Mas com todos a falar ao mesmo tempo, a reclamar tudo de todos, e a negar a si próprios o menor esforço com as justificações mais inverosímeis, não iremos a lado nenhum.

Por muitos «Prós e Contras» que encham o tempo televisivo.

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