quinta-feira, 27 de março de 2008

POLÍCIAS A MAIS E CRIMES A MENOS

Crónica da falta de segurança por aí

Em Portugal vislumbra-se sempre qualquer coisa irreal no horizonte, que um dia a nossa pequenez exalta até às nuvens ou mesmo engrandece até ao infinito, e na noite seguinte mete em alfurjas insondáveis. Há sempre qualquer coisa, por mais evidente que seja, que não funciona, qualquer coisa que, por mais intuitiva que se anteveja, necessita de ser explicada. Existem sempre factos extraordinárias ante os nossos olhos, muito acima do nosso entendimento os quais, na nossa arrogante insignificância e falta de bom senso, não conseguimos apreciar nunca na sua devida dimensão.

O Brasil também herdou de nós algumas desses contra-sensos. Contudo, pela enormidade do seu território e da população que o habita, poderá desculpar-se facilmente. Os brasileiros, na sua ânsia de progresso, dizem do seu país que é o maior, que já têm o maior isto e o maior aquilo… (claro que nunca falam nas maiores favelas!), enquanto os portugueses se vangloriam de ser os pais do Brasil e doutros povos mais…E também, de vez em quando, colocam alguns recordes caricatos no Guiness, como a maior árvore de Natal, a maior cataplana, o maior pão-de-ló…

Ao contrário dos brasileiros que propagandeam as coisas positivas e escondem as negativas, os portugueses passam o tempo a exaltar as suas misérias e a desvalorizar os seus merecimentos. Se não fosse assim, nem os nossos periódicos conseguiriam sobreviver!

Durante vários dias, a imprensa do país entreteve-se a explorar o filão da falta de segurança, apregoada a torto e a direito, a propósito de tudo e de nada, como se o país fosse o mais inseguro do mundo e os cidadãos nem pudessem por o pé fora da soleira da porta. Debalde o Ministro da Administração Interna se alargou em explicações e apresentou números e estatísticas porque, na ânsia geral demolidora que geralmente nos assoberba, ninguém já acreditava nele.

Logo os partidos da oposição, os mentores da opinião pública e os oportunistas de serviço começaram a aproveitar a onda de descontentamento circunstancial, cavalgando a exploração iniciada pela imprensa, pedindo soluções para a criminologia denunciada, o agrandamento das penas para os criminosos, o aumento imediato das forças policiais que as «medidas economicistas» do governo estava a travar, sem respeito pelos cidadãos…

Faltavam polícias! Os autarcas confirmaram, as associações profissionais de polícia corroboraram, acrescentando a fatal e consabida falta de meios. Finalmente os juízes, acusados de brandura e alguma permissividade perante os réus, clamaram, como qualquer pobrezinho pedindo misericórdia, inocência ante as «desastradas» leis existentes que se esfalfavam por cumprir, com todos os pontos e vírgulas que descobriam…

O Ministro estava a ficar esfrangalhado. Para se ver livre do alarido, pediu dinheiro às Finanças e lá prometeu o lançamento de mais dois mil polícias na bagunça, o que pareceu acalmar um tanto os reclamantes, não sem que alguém viesse a terreiro a constatar que esse número não era grande coisa, dividido pelas esquadras em funcionamento…

Ora, passada a espuma da onda, confirmou ainda a mesma imprensa alarmista, que o país era ainda, como se dizia, o tal de brandos costumes, a nível estatístico. Que não só a criminalidade em geral não tinha aumentado por aí além, como pedia meças à quase totalidade dos países da CE, para não falar de muitos outros por esse mundo fora.

A última do Diário Digital de hoje, diz apenas: «O governo anunciou esta terça-feira uma diminuição de 10,5% da criminalidade violenta e grave em 2007 e uma estabilização da criminalidade participada, relativamente a 2006.»

Mais notícias interessantes…e desconcertantes que essa mesma imprensa, a nossa imprensa, agora vem veiculando durante estes dias, merecem igualmente toda a nossa atenção.

Em primeiro lugar, sendo Portugal um país de baixa criminalidade é, na Europa, o que mais presos tem, nas suas cadeias!

E, finalmente, Portugal é o país da Europa com maior número de polícias, relativamente à população que protege, de acordo com as notícias seguintes:

« em Portugal, há 21 699 polícias, revela o «Diário de Notícias». Por cá, a média é de um polícia por cada 227 habitantes, enquanto a média europeia é de um agente para 350 pessoas.

«A TVI contactou as relações públicas da PSP, que confirmam o rácio de um agente para 227 habitantes, mas apenas na área de intervenção da Polícia de Segurança Pública e que abarca 4 milhões e 800 mil habitantes.

«A restante área é da responsabilidade da GNR. Aí, os números são diferentes, adianta a PSP, mas sempre acima da média europeia, garante esta força de segurança.»

Volto ao princípio. Em Portugal, nem tudo o que parece, é. E até as coisas mais comezinhas, ou as mais apregoadas necessitam, como estas que citei, de explicação cabal, competente e credível para poderem ser devidamente compreendidas pelo país das superficialidades bombásticas que somos.

Não sou eu a pessoa indicada para tal.

A mim só me apetece rir…para não chorar de vergonha.

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