A notícia
Portugal, C.M.30-11-2007 |
Greve com adesão superior a 80%
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Não é novidade, mas mais uma vez Sindicatos e Governo não entendem quanto aos números de adesão à greve. A Frente Comum fala numa adesão superior a 80 por cento, enquanto o Governo, pela voz do secretário de Estado da Administração Pública, João Figueiredo, afirma que apenas 20 por cento dos funcionários públicos aderiu à paralisação....
GREVES, NÚMEROS E OUTRAS COISAS
Mais uma vez, a juntar a todas as outras, os números referente à adesão à greve são contraditórios. A culpa não é da C. Social, muito embora o título da notícia acima pareça controverso. Por que motivo se destacou 80% e não 20%, como vem no fim da linha? A redacção do jornal responsabiliza-se pela não colocação, no mínimo, de um ponto de interrogação final no título? Assume a sua completa veracidade e a mentira da última frase em letra miúda?
Qual é o verdadeiro sentido do título? Não sei, nem quero saber. Só ela sabe, ou nem isso…
Num país onde o antigo sindicalismo e o corporativismo oficial foram banidos, com o fim da constituição de 33, o seu espírito permanece ainda no coração dos portugueses, especialistas em dar a volta ao texto e fazer o que muito bem lhes apetece, até que um camartelo lhes tire a vontade de devanear. É o camartelo, aliás e infelizmente, a única voz que se impõe e se faz cumprir, nesta democracia a quem todos batem palmas, mas que todos desrespeitam, à descarada ou à socapa. Também essa «lei» do camartelo, descendente da ditadura salazarista abolida pelo 25 de Abril, não conseguiu desvincular-se completamente da cabeça dos cidadãos e transformar-se na «lei» do diálogo democrático.
Provavelmente os mais velhos não conseguiram modificar hábitos antigos solidificados em cerca de cinquenta anos, e os mais novos não conseguiram adquirir e interiorizar a moderna forma de estar na sociedade. Mas o civismo também não é só diálogo. Exige cumprimento dos acordos e das leis, por vontade própria, sem necessidade de recorrer ao dito camartelo, quer seja ele imposto pelos radares, pela polícia, pela fiscalização, pela Justiça…O caminho a percorrer ainda é longo e não bastam as greves das sextas-feiras, os lock-out das segundas, as bastonadas das terças, os despedimentos das quartas e as reformas compulsivas das quintas, para levar este país a entrar no caminho do progresso.
Voltando à vaca fria. A greve é um direito dos cidadãos consignado na constituição e esta foi, sem dúvida, das maiores. Tenha ela sido cumprida por 20 ou 80% dos funcionários, não importa à Comunicação Social que se limita a ser o porta-voz dos órgãos informativos responsáveis, com maior ou menor independência, competência, tendência ou rigor. Mas discrepâncias de tal magnitude entre os números apresentados, não surpreendendo já o cidadão comum, leva-o a pensar, frequentemente, ao ler a primeira página dos jornais:
-Vão para o diabo! Lá estão eles com as suas aldrabices do costume!
E passa à frente.
Mas a coisa não é assim tão linear. Um cidadão verdadeiramente interessado no que sucede no país pode também fazer uma pergunta pertinente:
-Quem está a mentir?
Ou ainda tentar, na leitura atenta dos textos sequentes, tirar as suas próprias conclusões. Será coisa de um número mais reduzido, que a maior parte já não tem paciência para isso, intuindo-as a priori a partir dos títulos, quaisquer que sejam, ajustando-as à sua própria maneira de ver a realidade.
Sem querer fazer a quadratura do círculo, atrever-me-ia a sugerir que, em teoria, as percentagens expostas pela Comunicação Social possam ambas ser consideradas correctas, fazendo delas uma interpretação, talvez abusiva, mas bem intencionada. Assim, uma referir-se-ia ao número de trabalhadores que aderiram à greve e a outra, ao número de repartições de que fazem parte. Assim, contentar-se-iam gregos e troianos, ninguém seria considerado mentiroso, a Comunicação Social sairia certificada no seu duro trabalho de pesquisa, e todos, incluindo os cidadãos preocupados, poderiam já dormir descansados!...
Mas trata-se apenas duma sugestão. Não tenho nenhuma certeza que assim seja.
E não vale a pena especular mais sobre este assunto. Os vários sindicatos, os governantes e as diferentes corporações, vulgo «lobies», na moderna fraseologia, atirar-se-iam a mim como gato a bofe, na sua implacável intransigência.
Ficam satisfeitos assim, no seu radicalismo. Deixá-los lá!
Eu só aspiro, neste momento, viver tranquilo durante mais algum tempo…
2 comentários:
Para não variar, tem que haver discrepância entre os números.
Enfim, nada a que não estejemos já habituados...
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